Hardi Filho completa hoje, 5 de julho deste 2014, seus 80 anos de idade e 50 de poesia e literatura. Poeta e cronista, observador arguto, com o toque do jornalismo que praticou. Mas na crônica não deixa de lado o tempero dos sonhos. Além disto faz crítica literária quando a obra e o instante lhes aprazem.
Contamos, sempre com ele, a Academia e a comunidade literária, na organização, ajuda e preparo dos concursos e outros misteres. Tendo em vista o seu valor humano e literário, a Academia Piauiense de Letras, no último sábado, promoveu a comemoração do seu aniversário, fechando solenemente o semestre acadêmico. Um dia festivo marcante. E, nesta crônica que promete ser longa, relembro algumas coisas tiradas do baú da memória e ligadas à nossa vivência de amigos e poetas, que marcam o perfil psicológico e moral do homenageado. Direi, de início, como disse na festa acadêmica comemorativa, que Hardi Filho é um exemplo de probidade, generosidade, homem desprendido das coisas materiais e preso aos amigos. Nestes 50 anos de vida e vivência não tivemos sequer uma só “diferença”, na amizade, na camaradagem e no bem-querer, tudo batizado e carimbado desde o dia 5-7-1964, quando me ofereceu seu livro “Cinzas e Orvalhos”, com autógrafo firme de quem estava em plena forma. Logo que chegara da Bahia, aqui o encontrei e sua poesia adulta, forte, grandiosa, num estilo simbolista, cujas raízes adivinhávamos estar em Augusto dos Anjos e Celso Pinheiro, grandes mestres, o primeiro mais conhecido, o outro menos. Hardi Filho, em seu começo, é um simbolista equiparado ao que houve de melhor na literatura brasileira. A citação dos dois grandes nomes é apenas pra dizer que suas leituras eram das melhores, pois que se começa a conhecer o poeta por seus antecedentes de leitura. Quem lê bem, escreve bem; quem não lê, nunca virá a escrever – eis a minha glosa ao dito popular. Hardi leu bem e estreou impecavelmente com “Cinzas e Orvalhos”, em 1964. Há algum tempo venho tentando convencer a Academia Piauiense de Letras a incluir “Cinzas e Orvalhos” na lista de suas publicações comemorativas do centenário, a ser comemorado em 2017. Primeiramente, porque o livro do Hardi Filho é ótimo, ganhou um concurso da Prefeitura Municipal de Teresina e foi julgado pelos acadêmicos João Nonon Fontes de Moura Ibiapina, Júlio Martins Vieira e Mário José Batista como o primeiro lugar e merecedor do prêmio. Segundo, porque está completando 50 anos de publicada a primeira edição e possivelmente jamais será editado, pelo cálculo que se tem referente a reedições. Terceiro, porque Hardi Filho tem sido generoso na sua vida comum e na literatura; ele atende a todos que o procuram com prazer e bonomia; recebe todos em sua casa, conversa sabiamente sobre o fazer poético e o amor ao belo. Tudo isto, sem deixar de lado o seu propósito: Não procurar ninguém, não pedir a ninguém, quem quiser que o procure. Diante destas razões, meu apelo à APL, se vingar a idéia de publicação de alguns vivos, é editar Hardi Filho.
Antes que me esqueça, reabro o baú da memória e das saudades para acrescentar: Quando morei na Bahia (meus filhos fazendo o curso superior em Salvador e eu a minha pós-graduação em “Crítica de Arte”), meu dilema era não querer hospedar-me em hotel. Teresina, cidade onde fizera tantas amizades, me ia parecer estranha, quando a ela voltasse por férias ou outro motivo. Hardi Filho e dona Adélia ofereceram sua residência, com dormida e alimentação da melhor, não apenas a mim e dona Mécia, mas para qualquer dos meus filhos que aqui viessem. Este é um exemplo vivo, irrefutável. A nossa família, o favor tinha o gosto do provérbio de que “vinhos e amigos, quanto mais velhos melhores”. Mas sei de tantas outras pessoas por eles recebidas de muito bom grado, mesmo não parentes, não por uns dias ou meses, por muito mais. Não caberia, neste espaço enumera-los e indicá-los pelo nome, se lembrasse. Também sobressaem as viagens domingueiras ao balneário “Roncador”, no Maranhão, onde passávamos o dia com nossos filhos, tomando banho, almoçando, conversando e tirando fotos. A ida de manhã e a volta à tarde era sempre no mesmo transporte: o velho e saudoso jeep do Hardi. Outras tantas vezes ele nos levou ao Parque Nacional das Sete Cidades, visto que Hardi Filho era funcionário do IBDF, por cuja repartição pública federal aposentou-se. Mas a maioria dos nossos encontros ficou por conta dos movimentos literários, primeiramente do CLIP; depois, da UBE. O velho Círculo Literário Piauiense já completa 50 anos hoje. Ele já existia a partir de 1964, quando nós, os “três mosqueteiros”, por coincidência ou não, armamos a amizade e a luta: Hardi, Chico Miguel e Herculano, já poetas de livros publicados ou procurando fazê-lo. Tarciso Prado é culpado de tudo isto: ele me apresentou ao Hardi Filho e ao Herculano Morais. E continuamos na amizade e no gosto literário de diversas facetas, nas conversas sobre a vida, a literatura, as artes e a filosofia, não obstante os percalços do golpe militar de 1964. Como já foi dito noutras partes, o CLIP não tinha sede e reunia-se inicialmente na casa do Herculano Morais, e muito mais na casa do Hardi Filho e sua esposa, dona Adélia, que patrocinavam a bolacha, o café e o gosto de estarmos em família. O que há de notar-se é que nunca, nestes anos todos, houve “diferenças” na família - toda amiga - nem desavenças entre nós, embora sejamos bastante diferentes em pessoa e na poesia.
Finalizo, por falta de espaço para dizer tudo, escolhendo uma frase que o próprio Hardi Filho diz em determinadas ocasiões: “Eu não sirvo de exemplo pra ninguém”. Que humildade, amigo! Você é um exemplo de grande poeta, um dos maiores entre o que estão vivos e produzindo, no Piauí. Exemplo de pai, de esposo e de amigo, meu irmão! Gracias!
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*Francisco Miguel de Moura, escritor, membro da Academia Piauiense de Letras, amigo do poeta Hardi Filhos nestes 50 anos de viagem pela vida e seus caminhos, especialmente os da poesia.
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