sexta-feira, 24 de julho de 2009

OS MORTOS NÃO DEVEM MORRER


Francisco Miguel de Moura*


Acabo de chegar de minha terra, de uma viagem “em busca do tempo perdido”, das coisas perdidas, para reanimar as lembranças e as saudades. Acompanhou-me um filho com sua máquina de fazer retrato e cinema, ou seja, de fotografar e filmar, das mais moderninhas, o que não vem ao caso. Não viria se ele não houvesse registrado, entre outras coisas, o abandono em que está o “cemitério velho” de Francisco Santos (os mais antigos, leiam fazenda Jenipapeiro), no lugarzinho denominado Curral Novo, onde começou a história daquele burgo. Quando? Lá pelo meado dos oitocentos, pelos registros que temos hoje, quando duas famílias (Rodrigues e Sousa) aportaram por lá, vindas das Bahia, acompanhadas de mais duas ou três pessoas de raça negra, ou já mescladas com índios e portugueses. Falamos assim, colocando a imaginação para trabalhar, pois temos histórias da seca dos dois 7 (1877), contadas por Mãe Ana, uma de minhas avós. Tanto isto é verdade que no Cemitério abandonado de Francisco Santos há uma lápide já quebrada, rolando por entres as covas e catacumbas, com inscrição de pessoas sepultadas pelo meado do século XIX – dedicada ao major Rodrigues. Expliquei a meu filho que talvez não se tratasse de um militar, mas de um chefe de família do Império que, por seus méritos de patriarca, teria ganhado a patente, como era comum naquele tempo.

O errado é que o cemitério velho está ao deusdará, paredes caídas, animais pisoteando os túmulos, a erva crescendo à solta, comprometendo qualquer visita por mais ousada como a nossa, quando arranjamos vários arranhões nas pernas e nos braços por “juremas” e “unhas-de-gato” e o corpo todo ficou “encalombado”, com o cansanção e outras ervas e arbustos espinhentos.

Acima do único portão existente colocaram a data 1900 – ano da construção do anexo, que por sua vez, encheu-se de covas e depois de mato e abandono, como o primitivo. Ninguém vai mais visitar o túmulo dos entes queridos, por falta de condição mínima. A entrada escancarada (por falta da parede que caiu), o portão sem tranca ou aberto. E não se trata de um prédio tão grande, mesmo considerando o conjunto – o próprio cemitério e seu anexo – que não possa ser conservado por uma Prefeitura de pequeno porte como a de Francisco Santos – PI.

Minha indignação foi grande ao ver aquilo. Começa aqui a denúncia, mas vou fazer ofícios, ao Prefeito, primeiramente, e ao Conselho Estadual de Cultura (ou IPHAN), afim de que algo seja feito para a preservação do patrimônio público. Trata-se do prédio público mais antigo de Francisco Santos – Piauí, pois a Igreja foi construída somente em 1918. Depois, é a memória dos que chegaram ali e construíram aquela comunidade. Franklin, meu filho – que bancava de fotógrafo na ocasião, justo quando eu prometi que iria fazer um soneto eternizando os mortos dali – saiu-se com uma frase que considero lapidar:

– Os cemitérios são a memória viva dos mortos.

Talvez esta frase pudesse ser gravada em letras grandes, no pórtico do cemitério de Francisco Santos, caso o povo venha a levantar-se (os vivos) e as autoridades passem a escutá-lo, para o bem da história, da verdade e da vida (dos vivos e dos mortos).
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*Francisco Miguel de Moura, Escritor brasileiro, mora em Teresina, Piauí. Membro da Academia Piauiense de Letras - APL

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2 comentários:

Efigênia Coutinho ( Mallemont ) disse...

"OS MORTOS NÃO DEVEM MORRER"

Francisco Miguel de Moura,belo espaço cultural, onde leio um bom escritor, meus cumprimentos, este evento eu serei uma seguidora,
com admiraçâo,
Efigênia Coutinho
Escritora

Efigênia Coutinho ( Mallemont ) disse...

FRANCISCO MIGUEL DE MOURA, retorno ao seu belo espaço literario, e lhe convido para ler meus versos em meus dois Blogs, sendo um deixo o Link abaixo, com admiraçâo e respeito,
Efigênia Coutinho

http://efigeniacoutinhopoesiascomimagens.blogspot.com/

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