Francisco Miguel de Moura*
Há certas obras que nos despertam imagens às vezes muito estranhas e distantes da vida e da cultura atual. No caso, trata-se de “A Geometria do Fragmento”, trabalho de fôlego do poeta Leontino Filho, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, mas nascido cearense. Além de mestre da literatura, é poeta e crítico literário, desenvolvendo grande atividade em jornais e revistas, principalmente do Nordeste. Escreve com a beleza de um lírico apaixonado e a sabedoria de um doutor no assunto, com seriedade e embasamento teórico-filosófico. São 19 ensaios que honram a nossa crítica e teoria literária, quer pelo estilo – digamos que bem original – quer pelo valor das informações e dos incentivos com que remete o leitor à obra. A meu ver, não trata de um autor ou livro específico: faz uma análise em profundidade da lingüística, da filosofia e do fazer literário, com ênfase no sujeito, como bem anuncia: “A linguagem do espelho: o autor em questão”.
Não obstante pensarmos que somos letrados, os brasileiros lêem pouco. Não há como imaginar-se alguém lendo um livro de crítica literária, salvo se for um poeta ou professor universitário. A crítica não absorve a atenção de quem já não gosta do assunto poesia. Mas pode nos trazer determinada avaliação da vida, por via indireta. Os poetas têm a palavra como instrumento de trabalho, em busca do poema. O poema é o ouro que conseguem através da linguagem: palavras, fragmentos de texto e fragmentos de palavra, o que lembra a fábula grega do rei Midas, da Frigia, que pediu conselho aos sábios e depois compareceu diante do deus Sileno, fazendo-lhe um pedido: transformar “tudo” o que tocasse em “ouro”. O pedido foi concedido. Mas esse poder foi mal usado por Midas, que ficou em situação difícil: com sede e fome porque não conseguia tocar a água e a comida sem que estas se transformassem em ouro. Para que a situação normalizasse, recebeu um castigo: um par de orelhas como as de um burro. Por isto ficou conhecido pelo rei-burro, que os outros gritavam a seus ouvidos em todas as situações.
Esperamos que os poetas escolhidos por Leontino Filho para sua belíssima crítica e os leitores que estou em busca lembrem do rei Midas. Possam ouvir e ver as coisas normalmente para continuar a busca do ouro da palavra. “No princípio era o verbo...” A geometria do verso e do poema é metáfora da vida. Não extrapolemos como na fábula, mas não fiquemos sem conhecer o ouro e a jóia rara (o poema). E também esse livro. A obra de Leontino Filho é magnífica, sobressaindo o ensaio final, com exemplos de poemas de Foed Castro Chamma, realmente um dos grandes poetas brasileiros. E poucos conhecem. Poetas e críticos devem à história, ao povo – não à massa – a sabedoria secular. Mas os poetas criam, renovam.
Detalhando, se fôssemos julgar estudo por estudo, diríamos que o livro termina com chave de ouro. Mencionem-se, também, pela excelência, dois outros textos: “Dispersão: um livro, um poeta, um destino”, sobre o poeta e a poesia de Edson Guedes de Morais, e “No caminho, a metáfora do gozo insólito”, sobre R. Roldan-Roldan e seu fazer artístico. Sobre alguns autores há mais de um trabalho no livro, porém toda a ênfase fica com Roldan, digamos que foi quem mais o influenciou. Autores criticados, além dos dois acima: Jorge Tufic, Raimundo Herculano Moura, Ascendino Leite, Demétrio Vieira Diniz, Carlos Gildemar Pontes, Tanussi Cardoso, Zeilton Alves Feitosa e Francisco Miguel de Moura. É o livro mais completo de ensaios sobre poetas e poesia que li nos últimos tempos, principalmente sobre poetas contemporâneos. A geometria e a metáfora do livro e da história vão durar muito. Uma obra que veio para ficar.
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*Francisco Miguel de Moura - Escritor, Membro da Academia Piauiense de Letras.
Há certas obras que nos despertam imagens às vezes muito estranhas e distantes da vida e da cultura atual. No caso, trata-se de “A Geometria do Fragmento”, trabalho de fôlego do poeta Leontino Filho, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, mas nascido cearense. Além de mestre da literatura, é poeta e crítico literário, desenvolvendo grande atividade em jornais e revistas, principalmente do Nordeste. Escreve com a beleza de um lírico apaixonado e a sabedoria de um doutor no assunto, com seriedade e embasamento teórico-filosófico. São 19 ensaios que honram a nossa crítica e teoria literária, quer pelo estilo – digamos que bem original – quer pelo valor das informações e dos incentivos com que remete o leitor à obra. A meu ver, não trata de um autor ou livro específico: faz uma análise em profundidade da lingüística, da filosofia e do fazer literário, com ênfase no sujeito, como bem anuncia: “A linguagem do espelho: o autor em questão”.
Não obstante pensarmos que somos letrados, os brasileiros lêem pouco. Não há como imaginar-se alguém lendo um livro de crítica literária, salvo se for um poeta ou professor universitário. A crítica não absorve a atenção de quem já não gosta do assunto poesia. Mas pode nos trazer determinada avaliação da vida, por via indireta. Os poetas têm a palavra como instrumento de trabalho, em busca do poema. O poema é o ouro que conseguem através da linguagem: palavras, fragmentos de texto e fragmentos de palavra, o que lembra a fábula grega do rei Midas, da Frigia, que pediu conselho aos sábios e depois compareceu diante do deus Sileno, fazendo-lhe um pedido: transformar “tudo” o que tocasse em “ouro”. O pedido foi concedido. Mas esse poder foi mal usado por Midas, que ficou em situação difícil: com sede e fome porque não conseguia tocar a água e a comida sem que estas se transformassem em ouro. Para que a situação normalizasse, recebeu um castigo: um par de orelhas como as de um burro. Por isto ficou conhecido pelo rei-burro, que os outros gritavam a seus ouvidos em todas as situações.
Esperamos que os poetas escolhidos por Leontino Filho para sua belíssima crítica e os leitores que estou em busca lembrem do rei Midas. Possam ouvir e ver as coisas normalmente para continuar a busca do ouro da palavra. “No princípio era o verbo...” A geometria do verso e do poema é metáfora da vida. Não extrapolemos como na fábula, mas não fiquemos sem conhecer o ouro e a jóia rara (o poema). E também esse livro. A obra de Leontino Filho é magnífica, sobressaindo o ensaio final, com exemplos de poemas de Foed Castro Chamma, realmente um dos grandes poetas brasileiros. E poucos conhecem. Poetas e críticos devem à história, ao povo – não à massa – a sabedoria secular. Mas os poetas criam, renovam.
Detalhando, se fôssemos julgar estudo por estudo, diríamos que o livro termina com chave de ouro. Mencionem-se, também, pela excelência, dois outros textos: “Dispersão: um livro, um poeta, um destino”, sobre o poeta e a poesia de Edson Guedes de Morais, e “No caminho, a metáfora do gozo insólito”, sobre R. Roldan-Roldan e seu fazer artístico. Sobre alguns autores há mais de um trabalho no livro, porém toda a ênfase fica com Roldan, digamos que foi quem mais o influenciou. Autores criticados, além dos dois acima: Jorge Tufic, Raimundo Herculano Moura, Ascendino Leite, Demétrio Vieira Diniz, Carlos Gildemar Pontes, Tanussi Cardoso, Zeilton Alves Feitosa e Francisco Miguel de Moura. É o livro mais completo de ensaios sobre poetas e poesia que li nos últimos tempos, principalmente sobre poetas contemporâneos. A geometria e a metáfora do livro e da história vão durar muito. Uma obra que veio para ficar.
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2 comentários:
Professor Francisco Miguel de Moura, que honra enriquecer meu intelecto de conteúdos de excelência!
Aproveito para convidá-lo a visitar meu blog e, se possível, deixar o seu comentário. É o blog de meu livro, editado pela Biblioteca 24x7.
http://primaverasemflores24x7.blogspot.com
Sucesso e muita poesia em sua vida!
Explorando, navegando, chega-se a portos agradáveis, como este. A internet é uma das coisas boas por possibilitar fatos como ir ao Piauí, à África, Portugal, e fazer contatos, saber da lieratura, conhecer quem deveríamos mas, por limitações várias, agora minoradas, não conhecíamos.
Forte Abraço!
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