quinta-feira, 14 de agosto de 2008

BIOGRAFIA - JAMERSON LEMOS

Francisco Miguel de Moura*

Jamerson Moreira de Lemos nasceu em Recife (PE), em 22-12-1945 e faleceu recentemente em Teresina (5-8-2008). Poeta, deixando sua terra, viveu alguns anos em São Luís (MA), onde certamente se contaminou com a boa poesia daquela Província iluminada, de Gonçalves Dias a Ferreira Gullar, pra não falar nos mais novos. Tanto é verdade que o seu primeiro livro foi editado pelo Governo do Maranhão, com a participação da Academia Maranhense de Letras, no final da década de 60, século XX. Sempre o parto do primeiro livro é longo, por vários fatores que não cabe aqui explicar. Não poderia ser diferente com Jamerson Lemos. Saiu com o nome da “Superfície do Vento”, 1968, seleção de um calhamaço que me mostrara antes, com o título provisório de “Cerca de Arame”. Depois publicaria ainda “Sábado Árido” (1985) e “Nos Subúrbios do Ócio” (1996), ambos em Teresina. Deixou muitos inéditos, entre os quais “Istmo Soledad”, ao qual dei um prefácio já publicado aqui e alhures, situando sua poesia e seu fazer poético entre os melhores cultores da poesia-práxis, uma corrente derivada do concretismo, cujos poetas brasileiros mais conhecidos são Mário Chamie, Armando Freitas Filho, Mauro Gama e Adailton Medeiros (este natural de Caxias-MA). Esse modo de fazer poesia valoriza o ato racional de compor e busca um sentido intercomunicante entre versos e palavras, tudo integrado ao real quotidiano, objetivo, ou seja, o dado social-histórico vai de braços dados com a poesia e a pesquisa semântica ou semiológica. Quem mais se celebrizou neste “sertão-vereda” foi o João Cabral de Melo Neto, pernambucano como Jamerson Lemos. A preocupação maior com letras, sílabas e palavras do que com o espaço em branco ou preto da página faz da poesia de Jamerson um antilirismo que a muitos preguiçosos assusta. Mas, se bem observada, sua poesia é de um apaixonado das coisas belas, dos sentimentos mais puros e da riqueza na expressão, num estilo que parece desinteressado da vida e do real, deixando visível a veia do bom humor em todos os poemas.

A poesia-práxis é do Brasil dos anos 60. O CLIP – Circulo Literário Piauiense, movimento daquela década, de certa forma enquadra bem a poesia deste poeta que entrou para a convivência dos clipianos. Se do CLIP não fez parte oficialmente, foi por ter chegado ao Piauí pouco depois. Mas, de tal maneira integrou-se aos criadores do CLIP (Hardi Filho, Chico Miguel e Herculano Moraes), que seria pecado não incluí-lo nessa geração cujos efeitos ainda ressoam.

Casado com dona Maria das Dores de Morais Lemos, funcionária dos Correios já aposentada, Jamerson Lemos deixa órfãos seus dois filhos: Juninho e Ceres Josiane.

Duas vidas: uma, a familiar e sentimental como poucos; outra, a profissional, onde se desdobra para conciliar o vendedor de imóveis com o poeta. Reconhece Alberoni Lemos que não foi fácil ao poeta Jamerson Lemos. Daí que é impossível saber bem de sua poesia sem o conhecimento do homem, que se dizia descendente de judeu, em seus conflitos filosóficos e existenciais – acrescenta o grande homem de imprensa, Alberoni Lemos.

Mas, um pouco da poesia jamersoniana fará bem, seria mesmo imperdoável que não se oferecesse ao leitor. Então, com o título “Do movimento à noute” vai como exemplo:

“O mistério da espuma do mar / é não haver mistério algum. / Fundo longilíneo / maravilhoso o mar não se sabe um / convite à morte ao amor à / vida. Há mistério, há? // A espuma do mar longe de ser algo / incógnito, transcendental, flora / estrelinhas nas algas, águas, / sargaços e areia, namora / da luz às conchas, à lua minguante / e permanente se renova.” // Do mar o mistério da espuma / inexiste – bolhitas ou escumas –/ existe o mistério à bruma / de noite à noute uma a uma / a onda virada serpente / engole a solidão da gente.” (in “O Estado”. 04-10-87, Teresina, PI).

Hardi Filho considera que “J. Lemos, o boêmio navegador de ares e bares, nos dá um exemplo de modernidade poética soberba e despreocupada”, enquanto A. Tito Filho diz que “no poeta há sobretudo intensidade de expressão artística e estranho brilho verbal”.

Sim, mas resta dizer que Jamerson Lemos, da geração dos anos 60 (leia se CLIP), além de sua participação na vida cultural no meio piauiense, registrou-a valorosamente com dois prêmios importantes que recebeu, no Piauí: um da Academia Piauiense de Letras e outro da Fundação Cultural do Piauí, ambos de poesia. Desta forma, é impossível que o Piauí não o reconheça como seu poeta, aliás um dos mais singulares, como consta de “ A Poesia do Piauí no Século XX”, antologia organizada por Assis Brasil, Editora Imago, Rio, 1995.

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*Francisco Miguel de Moura, membro da Academia Piauiense de Letras, poeta e romancista, crítico e cronista, pertence à Geração do CLIP, anos 60 brasileiros.

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