domingo, 20 de outubro de 2024

 


        TERESINA AINDA ROMÂNTICA

                                                                                 

                                                                                    Francisco Miguel de Moura*

                                                                      

            Até o final de 1964, quando cheguei do interior da Bahia e decidi morar em Teresina,  a cidade carecia de muita coisa moderna. Era ainda, pode-se dizer, com relação a hoje e a algumas cidades do seu porte, uma cidade atrasada.

          Com o Golpe Militar de 1964, terminava uma era romântica, não somente para Teresina, mas para o Brasil, de modo geral.

          Vejamos, portanto, alguns dados.

          A praça Pedro II era uma festa aos domingos e quintas-feiras. As moças rodavam para um lado; os homens (rapazes) rodavam na direção contrária, deixando as moças cercadas, na parte central. Isto ocorria das sete às nove horas da noite, quando havia o sinal da Polícia Militar, espécie de toque de recolher.  A praça era dividida em diagonal que partia da Rua Paissandu e saía na Av. Frei Serafim (ou Antonino Freire?), por cujo leito passavam sonolentos e velhos veículos. Do lado de cá, dando para o Teatro 4 de Setembro e o Cine Rex, ficavam as moças de família e naturalmente os rapazes de família; do lado de lá, em frente ao Quartel da Polícia Militar (hoje, Centro Artesanal), ficava o restante do pessoal: moças de baixa condição social (pobres, pretas, mulatas, conversando com rapazes de sua laia), muitas vezes praticando namoros agarrados, indecorosos para a época.

          Havia dois cinemas, no centro, ambos na mesma Praça Pedro II: o Rex e o Teatro.  Havia o célebre «Bar Carnaúba», dos anos 50, quando Teresina comemorou o Centenário (1952), cujo bar eu imortalizei com o nome de um dos meus livros de poemas, “Bar Carnaúba” editado pela Universidade Federal, em 1983. E mais outros bares importantes havia ao sul da Praça. Estou me lembrando do «Americano». É muitos cafés. O Clube dos Diários, ali próximo, ainda funcionava, reunindo os restos da burguesia romântica, já quase (ou apenas) sentimental.

          Teresina não possuía emissora de televisão. Recebemos os primeiros sinais, da TV existente em São Luís (MA). Depois passamos a receber de Fortaleza. Tudo muito, muito deficiente, ruim de imagem e sim. Até que, finalmente, com batalha do grande idealista Válter Alencar, veio a nossa TV Clube, finalmente inaugurada, porém já no final da  década de 1970 ( precisamente em 03.12.73).

          A rádio mais ouvida, em Teresina, era a Difusora (com o seu sempre lembrado «Jornal Q-3») que, com a Clube (criada em 1961), formava todo o elenco de rádio-difusão existente. E é já pelos idos de l970  que surge a força da Rádio Pioneira.

          Com o surgimento da televisão no Brasil, o rádio já apresentava sinais de decadência, aqui em Teresina também. Mas ainda cheguei a assistir programas de auditório. A Clube e a Difusora faziam. E eram lindos.

          As famílias ainda se sentavam nas calçadas para a conversa familiar da “boca-da-noite” e tomavam o cafezinho, enquanto esperavam o vento «parnaibano». Todos, ou quase todos, iam à missa de domingo, nas igrejas do Centro (do Amparo, das Dores, de São Benedito). Bairros como o Jockey Clube, Fátima, São Cristóvão, São João e Noivos eram puro matagal, não havendo sequer estradas - apenas veredas. 

          O Hospital Getúlio Vargas só possuía dois pavimentos, contando com o térreo. De outros hospitais, não me lembro. Depois contruíram a Casa Máter, também lá pelos anos 70.  Agências do Banco do Brasil? Só uma. Funcionava ali onde foi a Câmara de Vereadores. Agências da Caixa Econômica? Só uma também. De outros bancos? Muito poucas: Banco da Lavoura de Minas Gerais é o que me vem à memória, além do Banco do Nordeste e do Banco Agrícola (depois Banco do Estado).

          Livrarias, se não estou muito enganado, havia a do Nilo (que ainda hoje lida no ramo, como a livraria «Leonel Franca»). Depois vieram as do Oston e a DILERTEC, do Nobre, etc. Aliás, foi um ramo que progrediu pouco, tendo em vista que, em 1960, Teresina  tinha 140 mil habitantes, contra os 90 mil de 1950. E hoje já vai beirando o milhão.  E já possuímos, agora, a Universidade Estadual. E só depois vieram chegando algumas particulares..

          Não havia aeroporto, mas apenas um arremedo. Só baixavam aqui aeronaves de bem pequeno porte mesmo.   Não havia asfalto. As estradas para o interior eram péssimas. Pontes sobre o Parnaíba: apenas a ponte metálica, que vinha dos anos 1930. Sobre o Poti, apenas uma, em um vão - dos dois que se conhecem hoje, dando sequência à nossa principal via, a Avenida Frei Serafim, em busca da Zona Leste e da estrada para Fortaleza.

          Cidade atrasada! Mas que saudade daquele tempo de muito silêncio, pouca luz à noite e pouca água nas torneiras pela manhã! Entretanto, o rio Parnaíba ainda não era poluído e se podia tomar banho de «coroa», aos domingos, sem nenhum sobrosso de doença ou infecção. Aliás, era uma das diversões românticas: ir para os banhos de «coroa», aos domingos, no rio Parnaíba, nosso “Velho Monge”, como bem apelidou o grande poeta Da Costa e Silva.

          Outra coisa bonita era a travessia para Timon, em canoas a remo, no rio, tranquilo mas corrente e profundo. Mais engraçado ainda era  passear pela cidade de Timon, gozando a tranquilidade do interior sem praticamente deixar a Capital. Bastava atravessar o rio, bucolicamente bebendo a paisagem. Imaginem! Naquele tempo já se achava que Teresina tinha muito movimento, cansava-se do barulho de carros e suas businas. Eu quis sentir o clima de Timon-MA e lá fui morar. Todo dia de mahã atravessava o rio e vinha trabalhar no Banco do Brasil. Tudo muito romântico, não é mesmo, leitor? Lembro de um jornalista “abelhudoque certa vez me perguntou, depois que me mudei pra Teresina, qual a cidade onde eu gostaria de morar, depois de  Teresina. E eu prontamente  respondi: Timon. Mas, por que Timon? Sem titubear, porque de lá e posso avistar Teresina até mais bela do que é. Ele emudeceu.

          Não me esqueço jamais da primeira vez que vi a Teresina, Nem da segunda e terceira vezes, uma delas logo após o meu casamento com Dona Mécia. Foi um passeio delicioso, delicioso mesmo.  Eu já  conhecia Fortaleza, mas achei Teresina, mais acolhedora. Claro, minha, nossa Capital, denominada tão bem, pelo escritor Coelho Neto, de “Cidade Verde”.

           Viva nossa Teresina, de ontem e de hoje! Espero que o novo Prefeito cuide dela, como deve. Para nossa satistafção e alegria.

         

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*Francisco Miguel de Moura, membro da Academia Piauiense de Letras

 

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom recordar a Teresina do passado, cheguei aqui em 1985, mas ainda peguei essa " pouca água na torneira pela manhã, o rio pouco poluído e os banhos na do rio" .👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻

Wilma Rejane

Franklin Morais Moura disse...

Lindo texto histórico.

CHIICO MIGUEL disse...

Obrigado, meus leitores, filho e nora

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