Francisco Miguel de Moura*
Quando acontece uma tragédia como a da semana passada, em Realengo, no Rio, as pessoas começam a perguntar-se: Por quê? Para quê? Como pode uma pessoa praticar tamanha crueldade, acabar com a vida de tantas crianças e adolescentes, sem nenhum propósito? Será que Deus nos abandonou, não está mais cuidando do mundo? “Deus! ó Deus! Onde estás que não respondes? / Em que mundo, em que estrela tu te escondes / Embuçado nos céus?” É a mesma indagação do grande poeta Castro Alves diante da tragédia, continuada por séculos, dos navios negreiros, onde os negros morriam aos montes, de doença, maus tratos, torturas, fome e sede, durante a longa viagem pelo oceano, comprados que eram na África, para a escravidão no Brasil.
Mas isto já faz séculos, dirão. O mundo era colonizado, a civilização marcava passos na história.
Bem, mas o homem não mudou ou mudou muito pouco. Quando acontecem fatos assim é porque algo está podre, ou alguém ou a sociedade, ou ambos adoeceram. Percebe-se que também pratica atrocidades quem não é doente da cabeça: psicopatia, esquizofrenia e outras genericamente apelidadas de neuroses, não definitivamente conhecidas pela ciência. Depois, “o homem não é bom nem mau, o homem é sadio ou doente”, filosofam algumas pessoas que se acham acima do bem e do mal. Ora, o que bem se sabe é que as doenças têm vários graus e várias formas, nomes, etc. As que desmantelam as múltiplas funções do cérebro são profundas, têm origem e fim no cérebro onde os cientistas dizem localizar-se a alma, a direção do homem. Para a esquizofrenia há remédios paliativos, a partir dos quais o paciente poderá viver sem maiores atritos ou danos à sociedade. Com relação à psicopatia, não há remédio. Segundo a opinião de Glória Perez, “psicopata não tem semelhante, ele nem sabe o que é isso”. E se ele não é nosso semelhante, como reconhecê-lo? Como tratá-lo? Está posta a questão.
Há também as chamadas doenças sociais. As guerras são doenças sociais, muito temidas pelos estragos que causam à humanidade. Dizem também: Podem trazer benefícios, despertar a ciência para estudos, etc., com o que não concordo. Mas é preciso lembrar que há ondas de guerras, ondas de ódio, ondas de amor, ondas de sofrimento, assim como epidemias. No caso de ondas de amor ou paixão, a mais pesada e mais funesta foi a provocada pelo suicídio de Werther, personagem do romance “Os sofrimentos do jovem Werther”, de Goethe, escritor famoso do romantismo alemão, que fez grande sucesso entre os jovens. A acreditar nos críticos coetâneos, a onda de suicídios entre os jovens, observada na época, teria sido provocada pela leitura do referido livro.
Diante da tragédia de Realengo, pergunto mais: Quem criou tal predador, quem criou tal monstro? Monstro, porque não é nosso semelhante, embora de carne e osso. Quem o fez evoluir ou involuir? Fomos somente nós, os vizinhos, os pais, os professores, os colegas de colégio, a sociedade como um todo? Ou ele é um erro da natureza, uma ferida, um genes podre? De uma forma ou de outra, vivemos numa sociedade planetária, na qual, pelas ondas da internet, todos influenciam todos, e assim são grandes as ameaças de uma doença maior. E, por fim, como cooperar para que monstros criminosos, sem sentimento, nasçam, cresçam e fiquem livres? Somente com amor, trabalho, ciência, educação, respeito e consciência. E tudo isto inicia comigo e com você, caro leitor, em casa e na rua, até virar uma onda, na qual imergirão esses males desarticuladores do tecido social e da espécie humana.
http://cirandinhapiaui.blogspot.com
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Francisco Miguel de Moura - Escritor brasileiro, membro da Academia Piauiense de Letras - Teresina, PI, e da International Writers and Artists Association - Estados Unidos
9 comentários:
Meu querido,
E enquanto não se conhece a cura para o desequilíbrio humano, nossos filhos, pais e a sociedade padecem.
prazer em te ler.
Beijos
A atribuição de culpa a um outro setor pode parecer confortável até um certo ponto, pois vende a falsa ilusão que não temos a menor participação em qualquer fase da degeneração social. No entanto, enquanto pensarmos assim, o problema só tenderá a crescer, pois o mecanismo restará falho no momento em que muitas engrenagens não são postas no movimento adequado.
Um grande bj querido amigo
Sr. Miguel,
O mundo está doente e o remédio para curar essa chaga é o amor.
Sem querer defender o atirador do Realengo -porque nada justifica tamanha atrocidade - esse rapaz também foi uma vitíma.
Ele não tinha ligação com nenhum grupo terrorista (tudo fruto da esquizofrenia), porém vivia seu terrorismo particular que culminou na tragédia, ceifando a vida de tantos inocentes.
Triste tudo isso. Que possamos refletir em meio a esse caos.
Parabéns pelo excelente artigo! As citações se relacionam muito bem com o tema.
Abraço sogrinho.
Este rapaz de realengo jogou tudo que a civilização ensina e recomenda na lata do lixo. Ele, com sua barbárie inexplicável nos deixou atônitos. Como um de nós usou jogar a civilização no lixo? Como sair por aí matando criancinhas a troco de absolutamente nada? Não estamos entendendo. E ele, antes, nem era louco (pelo menos de um tipo loucura que conhecíamos até ali) nem criminoso (pelo menos de um tipo de crime que conhecíamos até ali). Olhamos atônitos para nós mesmos e vacilamos em reconhecer nele um semelhante. Será que está surgindo uma espécie nova? Será que ela é produto de nosso modo de coexistirmos?
Gostei de todos os comentários, mas sonhava em que mais pessoas tomassem conhecimento do meu artigo, pesquisado, pensado, medido e sentido. Ele foi publicado em o jornal "O Dia", Teresina, de sabado, 16 de abril de 2011. Ainda bem que nem todos que o leram aqui na internet se prontificaram a comentar, mas é claro, mais pessoas leram, assim como os que compraram o jornal acima mencionado.
Fico recompensado por isto, fazendo minha parte.
Abraços a todos os meus leitores
FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
Hey, parabéns pela lucidez com que nos invoca ao debate interior... quem de mim está lá, quem de mim se une a este monstro?... parece muito distante, mas disseste bem:
"tudo isto inicia comigo e com você, caro leitor, em casa e na rua, até virar uma onda, na qual imergirão esses males desarticuladores do tecido social e da espécie humana."
E por isso, e por te ler,e pelo que viemos convivendo cotidianamente, temos que desatar o amor de construção, acimentar nossos dias com mais implicância, somos sujeitos deste tempo, por isso conversar nos ajudará a mudar a morfologia e sintaxe de tal bárbarie, acredito nisso, e te ler me arregalou os olhos.
Um beijo amigo e boa semana. E estou levando lá para Vidráguas, tomara que muitos leiam.
Carmen.
Por meio de Carmen Silva Pesotto que venho a conhecer o senhor e sua essência literária e ética cidadã, parabéns!!!
O homem foge... a sociedade foge.... o Estado foge... os cientistas fogem... o coletivo inexiste e foge a possibilidade de bem existir por e entre os indivíduos que cada vez mais se atomizam... A individualização aponta o dedo... é monstro.... psicopata... e esquizofrenia... é tudo de menos meu reflexo ....
Mineirim das Gerais
Wellington Bernardino Parreiras
Excelente sua visita a meu blog com sua opinião.
Já fui ao seu mas acho que não consegui deixar o comentário.
Mas a discurssão sobre educação e professor vale a pena. Pode ser que assim milhoremos o mundo com os nossos conceitos de quem tem a cabeça no lugar e a alma está a fluir poesia todo tempo.
Abraços
francisco miguel de moura
Prezado Francisco MIGUEL DE MOURA,
peço desculpas pelo retardo da resposta, estive ausente por um tempo e quando voltei não verifiquei as mensagens do blog.
Agradeço pelo afeto e respeito, tente novamente, caso não consiga pode contatar-me no facebook pelo meu nome na pesquisa Wellington Bernardino Parreiras ou podemos conversar via -email well.bernardino@yahoo.com.br.
Abraços fraternos,
Wellington
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