segunda-feira, 20 de março de 2017

A POESIA NÃO TEM DIA NEM HORA, MAS HOJE…

Francisco Miguel de Moura*.

Viva a poesia. Vivam os poetas. Hoje é 14 de março. Comemoramos a poesia nacional, mas pode ser internacional também. Que bom seria se ainda se lesse poesia como antigamente! Eu digo e provo: a não ser os poetas, os que são meus amigos, poucos lêem meus poemas colocados nas chamadas redes de comunicação da internet. E é onde se lê, e pouco, é na internet mesmo. Voltamos no tempo, voltamos à cultura visual – aquela que sempre existiu desde o homem da caverna. Temos um cérebro muito cheio de porcarias que a televisão e todos os meios de comunicação, inclusive jornais e revistas, nos metem pela garganta.

Os poetas lêem os poetas, e pronto.

Cadê Castro Alves, quase adorado pela mocidade escolar, com seus versos candentes, cheios de amor e de paixão, cheios de esperança e de crítica, cheios de natureza e de humanidade? Quem não sabia ao menos uma estrofe do “Navio Negreiro”? Ou de “O Livro e a América”? Ou uma quadrinha de “O Gondoleiro do Amor”? - Recitando as duas primeiras: “Teus olhos são negros, negros, / Como as noites sem luar… / São ardentes, são profundos, / Como o negrume do mar; // Sobre o barco dos amores, / Da vida boiando à flor, / Douram teus olhos a fronte /Do Gondoleiro do amor.”

Se fôssemos transcrever os versos mais lindos, mais fortes, mais inspirados de Castro Alves passaríamos aqui o dia, a crônica inteira, o dia e a noite. Lembremos, pois muitos não sabem, que a data que comemoramos em 14 de março é justamente a data natalícia de Castro Alves, que veio ao mundo no ano de 1847, na fazenda Cabaceiras, freguesia de Muritiba e comarca de Cachoeira, na Bahia. Para mim e para muitos é ele um dos maiores poetas brasileiros, senão o maior. Sua poesia enche de vida e sentimento a alma dos que o tocam (lêem). Pela leitura é que o homem consegue alcançar a maior sabedoria, pois poesia é intuição, luz e palavra (banhada de luz). “A sensibilidade do imaginativo desse gênero (poesia) é principalmente estimulada pela vista, pelo movimento e pelo tato”, escreve Eugênio Gomes, numa introdução à “Obra Completa”, de Castro Alves, Ed. Aguilar,1966, Rio de Janeiro-RJ. Este pensamento indica que a riqueza do poema é englobar todas as artes e ainda mais a filosofia e a ciência. Poesia, arte por excelência. Quem não lê poesia, enferruja-se, encaracola-se, cega, morre.

Ora, ora, perguntarão:

- E o que é poesia?

E eu lhes respondo:

- Poesia é vida, poesia é música, dança, teatro. Poesia é amor e também natureza. Poesia é de Deus e é Deus.

Lembro-me de quando eu estava ainda na meninice, mal tinha aprendido a ler e, nas férias frequentava a casa de meu avô paterno, Sinhô do Diogo. Ele lia, tinha um monte de livros, para a época. Contos, histórias de cavaleiros da Idade Média, poesias e até um livro de cem cartas de amor, que eu adorei, juntamente com os de poesia. Castro Alves, Casimiro de Abreu, Gonçalves Dias, Fagundes Varela e outros. Os românticos em especial. E eu comecei a aprender bem por lá. A leitura é uma das maneiras mais inteligentes de aprender-se a sentir e a pensar, amar e querer bem, a meditar, a ser gentil e humano. Sinceramente, não sei por que a cultura chamada pós-moderna, ou “pós-nada”, cancelamos o caminho da leitura. Nas escolas, nos hospitais, nas creches, no ônibus, no consultório médico, em casa sempre, sem desprezar a privada, onde temos todo o tempo e toda a liberdade de fazer e acontecer. São todos lugares de se ler e aprender.

Voltando a minhas leituras: Castro Alves era uma das minhas maravilhas. Depois conheci outros poetas: Raimundo Correia, Olavo Bilac e Camões; muitos outros portugueses, chegando a Fernando Pessoa. Dos brasileiros, degustei Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, João Cabral, meus mestres. Mas há tantos outros poetas bons, impossível citar todos. A poesia não tem dia nem hora. Poesia é todo dia, toda hora. Para os que não participam do maior instrumento de civilização – a leitura. Sem ela, babau! Teremos apenas analfabetizados, aqueles que conseguiram frequentar a escola e depois esqueceram-se dela, do melhor da escola: o conhecimento pela linguagem, pela luz da consciência de saber-se uma criatura pensante.

- Você está lendo o quê?

Não caia na besteira de perguntar isto a mais de duas ou três pessoas na rua. Você se decepcionará:

- Nenhum, eu nunca li um livro, me dá um sono!... E sendo de poesia aí é que não leio, pois não entendo nada da matéria.

Não entende nem vai entender. Isto e muitas outras coisas do mundo que está acontecendo a seu lado. Não direi à sua vista, pois quem não lê é cego. Você pode saber muito de estatística, de dinheiro, de bolsa, de jogar na loteria, de entender e torcer por um time de futebol, de carnaval, de pular junto com alguns “macacos” que pulam no palco, mas não tem voz, não cantam, não dizem, não sabem música. Quando muito, sabem bater tambor e outros instrumentos “modernos” mais sofisticados para fazer barulho. E nada mais. Depois de tudo, o sono (ou o pesadelo?) a troco de bebida, droga ou de algum sonífero menos maléfico. E vai gastando a saúde, vai andando para baixo. Que sonhos você terá? Nenhum.

Ah, se o mundo voltasse para a educação sem dogmatismo! Não essa que está aí, a que ensina que ninguém nasce macho ou fêmea, o mundo é que o faz. E como faz loucamente muitos outros sexos… Calemos. Eu prefiro o amor à moda antiga, a educação à moda antiga, a cultura que não esquece suas raízes, as leis que não sejam casuísticas, a democracia ao comunismo e suas variações, o casamento aos acasalamentos sem responsabilidade para com os frutos desse amor sem raízes, amor sem amor, simplesmente sexo, sexo... E dor, depois. Porque esses preparam a solidão a sós, desculpem o pleonasmo, a doença abandonada, os crimes contra a família - a célula máter da sociedade civilizada. Não, eu prefiro a poesia, o amor, a amizade, a luz do sol, o mundo verde, a doçura de um livro à cabeceira. Não digo que não uso o celular. Mas, coitado, ele foi desfigurado. E virou pura tolice. Enfim, estamos numa selva. Nus e com fome. Como nos primeiros tempos, atrás da caça que não alcançamos. Porque já a perdemos há muito tempo, sem dó nem piedade.

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*Francisco Miguel de Moura, poeta, membro da Academia Piauiense de Letras.

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