Francisco
Miguel de Moura
Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras
Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras
Quando digo escatológico é metaforicamente significando o que, realmente, na filosofia grega, tinha o sentido de buscar o fim das coisas, das almas, do mundo, do universo. Franklin Jorge é um desses escritores que não medem distâncias nem sacrifícios para alcançar o sumo, a súmula da nossa cultura e civilização.
Franklin
Jorge é, indiscutivelmente, um dos escritores brasileiros ainda em
boa idade de produção, Portanto, não é nenhuma promessa. É, de
fato, um mágico da palavra. Embora tenha nascido no Brasil e aqui
permaneça, pelo seu estilo e modo de ver e sentir o homem e sua real
situação como o enigma do Universo, é internacional, bem poderia
ser francês ou inglês como Edgar Alan Poe, Balzac ou mesmo
Shakespeare. E não brasileiro, escrevendo nessa língua tão doce e
gostosa que é o português e por isto digamos que fora da imprensa
internacional, como costuma fazer a mídia.
Meu
espaço diga-se que é mais fechado ainda. Ele é jornalista da
maior envergadura e eu vivo muito fechado, em virtude dos anos, dos
males que me fustigam, das obras que também quero terminar, morando
neste cubículo de mundo que é o Piauí. Não sei se vale a pena
escrever alguma coisa. Espero que sim, pois está reunindo as
matérias que falam sobre ele, numa espécie de fortuna crítica e,
quem sabe, eu pudesse ter um cantinho lá no seu tesouro, nem que
fosse pela amizade que nos une desde já um bom tempo.
É
isto, afinal, que me move dar um depoimento crítico, uma opinião
sobre o poeta, o romancista, o cronista, o crítico literário e o
crítico de jornal, como um batalhador incansável na escavação da
verdade que nos atormenta e terminamos por enganá-la pela força dos
discursos intercalados da sociedade e a confusão que eles nos fazem.
Somos
amigos, da forma como foi dita, ou seja, por escrito, visto que
pessoalmente não nos encontramos. Talvez por isto me considero
insuspeito. Ele é um poeta tão original que desiguala a poesia e
os poetas contemporâneos. Como um Fernando Pessoa ou um Nietsche,
pela força como abriram as portas do verbo, embora depois de
passagem elas sejam novamente travadas, eis os dois escritores que me
vêm à lembrança quando me deito a ler os livros de Franklin
Jorge. São tantas as suas obras que nem seria possível enumerá-las
aqui. Mas “O livro dos Afiguraves” e “Spleen de Natal”, são
os dois que me vêm à memória. Tem também “Gente de Ouro” e
os tantos livros de poesia, uns poucos editados e outros ainda
inéditos (pelo que tenho notícia, são dez). Editor de tantos
jornais, sejam os normais ou os denominados “on line”, sua
escrita é profunda e variada, sinal de que tenta abarcar o mundo
pela arte, o que não é uma má ideia, desde que os potentados
comecem a sentir o fenômeno.
Sabemos
ainda muito pouco de nós e muito menos das artes, das letras, da
literatura, pois são tantos e ínvios os seus caminhos. Se pelo
que sabemos for suficiente para que a nossa obra fique, a de Franklin
Jorge ficará, com certeza. Eu disse, num poema, certa vez, que "tudo
quanto existiu há sempre de existir"
. E é nesta crença que nos baseamos, escritores e artistas.
Gostei
muito de uma frase que Franklin Jorge escreveu, falando sobre
Faulkner, aliás, outro autor que lhe é, em tamanho, semelhante; em
estilo, seguro; em imaginação, fabuloso: “Um
escritor, se for um bom escritor, será arrastado por demônios,
perderá a paz, a decência, o orgulho, a honra, a felicidade e a
segurança, desde que possa escrever, pois a arte não tem nada a ver
com paz e alegria”. E
acrescenta: “A
impiedade seria um dos atributos mais notáveis do escritor que se
compraz em sua arte e se mantém, permanentemente, ocupado”
(Chatham,
pg. 11/12).
Sua
prosa, conforme referi num artigo de antes, sobre “O livro dos
afiguráves”, sobre a cidade que estuda e sente suas pessoas
(almas) mais significativas em popularidade e singularidade, é uma
prosa vigorosa, de quem sabe o que faz, de quem se finca no que faz.
Finalmente,
para saber quem é Franklin Jorge havemos que ler, reler e treler
suas obras nem que seja porque duvide de Deus ou do Diabo, nem que
seja porque duvide que a leitura vale a pena. Vale ser vivida em
letra e espírito, mais do que a imagem de cores que desbotam. Ao
contrário, a cada vez que abrimos uma página de Franklin Jorge,
mesmo sem conhecê-lo pessoalmente, lá o encontra, lá duvida, lá
espera, lá desespera, lá se vê também como um ser inacabado,
embora vivo. Vivo por que? Vivo porque escreve, vivo porque lê, vivo
por que ama desse amor esquisito que não precisa de nada - a não
ser do som, da letra, da luz, do sentir em todos os sentidos.
Desculpem-me,
os leitores meus e de Franklin Jorge, pela pressa, se a conversa
está comprida, corte-a, se o sono e o cansaço já chegaram
sente-se, deite-se, pois sua obra é incomparável. Por isto mesmo,
de propósito não falei em nenhum contemporâneo. Poderia ter
lembrado O. G. Rego de Carvalho, mas como ele já se foi, respeitemos
o seu silêncio, pois o que não é silencioso, o que é medo e o que
não é mentira, tudo isto foi escrito e não passa. Embora diga a
Bíblia que tudo passa. Mas a palavra não passará, justo por ser o
que somos. E se fomos e se somos, não sumiremos. Assumiremos, nas
nuvens, no céu ou na terra, na lua, no sol ou em qualquer estrela
onde entraremos sem pedir licença, com a nossa luz, a “Irene”,
do poema de Manuel Bandeira.
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(Artigo publicado no Jornal "O Dia",Teresina, Piauí, em 21-01-2017, pg.6)
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