quinta-feira, 27 de novembro de 2014

A FAMÍLIA “MOURA” E “MOURA FÉ”, NO PIAUÍ

Francisco Miguel de Moura
Escritor e membro 
da Academia Piauiense de Letras



    Falar ou escrever sobre a família “Moura Fé” ou simplesmente “Moura” tornou-se muito fácil, depois da genealogia da família “Moura Fé”, levantada pela Prof. Iracilde Maria de Moura Fé Lima. Sem esquecer os ramos que dispensaram a última expressão, assinando-se apenas “Moura”, foi uma das primeiras famílias a povoarem a região da fazenda “Curralinho”, ou seja, onde hoje está a cidade, o município e a região de Picos. Todo o seu conhecimento é resgatado, descrito e expresso, admiravelmente, pela Profª. Iracilde Moura Fé Lima, em seu livro “De Moura aos Moura Fé - Resgate de uma trajetória”, Teresina, PI, 2005. Desse livro, com grande honra e orgulho, fui o prefaciador escolhido pela autora. 

Tudo começa com seu primeiro membro, Leonardo de Moura Fé, um funcionário da Coroa Portuguesa, que veio ao Brasil para fiscalizar as sesmarias, ou seja, se estavam sendo cumpridas as ordens do Rei. Chegou por outra rota, vindo pelo Pará (Belém) ou Maranhão (São Luís), e não pela comum que era Bahia, Pernambuco. Veio para o Brasil, aqui chegando em 1755.

Antes da chegada de Leonardo de Moura Fé, já Felix Borges Leal, sobrinho de Antônio Borges Marinho Leal de Souza Brito, estabelecera-se em “Curralinho”. Félix Borges Leal era o pai de Maria Borges Leal. E esta se casou com Leonardo de Moura Fé.  O casal Leonardo de Moura Fé x Maria Borges Leal teve 8 filhos e muita descendência, tanta que se espalhou por toda a região (Oeiras, Jaicós, Simplício Mendes, Valença, etc.). Do seu casamento nasceram os seguintes filhos: Maximiano de Moura Fé, Leandro de Moura Fé, Bárbara de Moura Fé, Leonor de Moura Fé, Francisco de Moura Fé, Manoel de Moura Fé, José de Moura Fé e Joana de Moura Fé. 

Segundo a genealogia da família “Moura - Moura Fé”, eu sou um descendente do primeiro filho, Maximiano de Moura Fé.  Em linha reta, dos primeiros aos últimos, vai aqui uma pequena demonstração: 1ª GERAÇÃO: - Leonardo de Moura Fé x Maria Borges Leal; 2ª GERAÇÃO: - Maximiano de Moura Fé x Ana Morais Rego; 3ª GERAÇÃO: - Valério de Moura Fé x Joana Maria de Jesus; 4ª GERAÇÃO: - Bento de Moura Fé x Joana Maria do Espírito Santo; 5ª GERAÇÃO: - Bernardo de Moura Fé x Teresa Maria Leal; 6ª GERAÇÃO: - Feliciano Borges Leal x Zeferina Maria do Espírito Santo; 7ª GERAÇÃO: - Miguel Borges de Moura (Miguel de Ouro) x Josepha Maria de Sousa (estes são meus bisavós paternos); 8ª GERAÇÃO: Feliciano Borges de Moura (Sinhô do Diogo) x Rosa Maria da Conceição; 9ª GERAÇÃO: - Miguel Borges de Moura (Miguel Guarani) x Josefa Maria de Sousa; 10ª GERAÇÃO: - Francisco Miguel de Moura (Chico Miguel) x Maria Mécia Morais Araújo Moura.

Mas a Profª. Iracilde Maria de Moura Fé Lima vai longe na pesquisa sobre a família Moura.  Foi buscar documentos em Portugal. Eles indicam que os “Moura” vieram da Vila Auricitana (hoje cidade Moura), no sudeste de Portugal, recuperada dos mouros, na batalha final da expulsão deles da Península Ibérica, em 1.160, pelos irmãos D. Pedro e D. Álvaro Rodrigues. Pelos seus feitos, foram agraciados pelo Rei, o qual lhes acrescentou o sobrenome MOURA. Foi a partir dali que chegamos aos nossos dias. 

Por outro lado, a pesquisadora verificou, ao longo do trabalho e organização, que algumas famílias, em algum lugar, nos longes do tempo, abandonaram o “Moura” ou “Moura Fé” por outro sobrenome. Exemplos são os “Mendes”, de Simplício Mendes-PI e redondeza, que pertencem ao ramo dos “Moura” E também os que deixaram o sobrenome “Moura” ou o “Fé”, para ganhar outros. Na região de Picos ficaram apenas os “Moura”, já os habitantes da Sussuapara e Bocaina conservaram o “Fé”, por exemplo.

Confesso que, em inúmeras passagens da leitura como prefaciador, senti-me verdadeiramente emocionado, orgulhoso de pertencer a uma família moralmente de tão bom gênio - não se conhecendo, ao perpassar dos séculos, crimes ou pessoas de má conduta – e composta de espíritos dados às artes, às letras e ainda à alta política e administração pública, para não falar no mourejo das atividades mais comuns, porém produtivas, como professores, funcionários públicos, profissionais liberais, criadores, agricultores, comerciantes, povoadores destes sertões com a fertilidade da terra e de tantos filhos e filhas, e conservando sempre a tradição do nome “Moura Fé”, ou somente “Moura”. Muitos costumes, muitos problemas, alguns já praticamente solucionados como a divisão das terras, a reforma agrária natural em Picos – PI são abordados, e as ligações da própria história do nosso Estado e de famílias, nos mais diversos lugares. Foi mais longe, trazendo parte da história de Portugal.  Livro de profundo conhecimento adquirido com suado trabalho. De modo particular, por muito gostar, aprendi a lenda da “Princesa Moura”, sobre a qual pretendo ainda escrever uma crônica, um conto ou um romance.

As personalidades mais conhecidas com o nome “Moura”, em Picos, são três irmãos: Dr. João de Moura Santos, médico e Deputado Federal; Dr. Waldemar de Moura Santos, farmacêutico e Senador; e Adalberto de Moura Santos (Bertinho), um dos prefeitos da cidade, todos os três eram filhos do Cel. Francisco de Sousa Santos, o chefe político da cidade durante muito tempo e várias vezes tendo assumido a direção da Prefeitura, entre outros cargos políticos no Estado. É bom não esquecer que a esposa do Cel. Francisco Santos, Balbina de Moura Santos, é da mesma família “Moura” que estamos focalizando. 

Finalmente, podem ser importantes para o leitor, essas duas informações: 1ª) - Dr. Sílvio Mendes, ex-Prefeito de Teresina, homem de muita cultura, inteligência e capacidade político-administrativa, além do seu conhecido caráter atestado por sua conduta moral e ética, portanto um grande valor da sociedade piauiense, é descendente da família “Moura”, como atesta a Profª. Iracilde; 2ª) - Também o Prof. Fonseca Neto, da Universidade Federal do Piauí e membro da Academia Piauiense de Letras, pesquisador e historiador de grande mérito intelectual e brio moral, maranhense de nascimento, faz parte dos “Moura Fé”, conforme catalogado na genealogia mencionada.

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Nota: Quase todas as informações aqui colocadas foram tiradas do livro "De Moura aos Moura Fé - Resgate de uma trajetória",  Teresina, Piauí, 2005 - Autoria da Profª Iracilde Maria de Moura Fé Lima, de cuja obra fui o prefaciador.( Francisco Miguel de Moura)

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

MANOEL DE BARROS – GRANDE POETA ESTRANHO

 Francisco Miguel de Moura*

Tenho a impressão de que se perguntássemos a Manoel de Barros “o que queria ser, se ele não fosse poeta”, teríamos a mesmo resposta que eu já enfiei na cabeça de muita gente: “Se eu não fosse poeta, queria ser poeta”. E ele foi e é um grande poeta: faleceu no dia 13-11-2014, com 97 anos, mas deixou muitos livros e muita poesia neste mundo.

Fazendeiro, advogado e poeta, mais poeta que qualquer outra coisa, porque observador minucioso da natureza e das coisas da natureza, nasceu em Cuiabá, às margens do rio do mesmo nome, aos 19 de dezembro de 1916. Filho de João Venceslau Barros, capataz da região. Porém, Barros ainda muito cedo se mudou para Corumbá, no Pantanal. Só nos últimos anos passou a viver uma vida reclusa em Campo Grande (MS). Reclusa, para os seus biógrafos apressados, pois costumava passar dois meses, todo ano, no Rio, em contato com a “civilização”.  Manoel de Barros escrevia à mão e brincava: “Não uso computador, sou metido, escrevo à mão, acho que na ponta do lápis tem um nascimento” e “gosto de coisas que começam assim: antigamente o tatu era gente e namorou a mulher de outro homem”. O segundo pensamento está em “Vozes da Origem”, da antropóloga Betty Midlin.

Pronto, chegamos à antropologia, leituras mais apreciadas pelo mago da poesia que é Manoel de Barros. E sabem por quê? Bem, porque era um filósofo poeta e um poeta filósofo. Sim, fazia tudo aquilo que fazem os poetas originais, singulares, criadores. Era um filósofo porque perguntava pelas origens, era poeta porque inventava palavras, frases, pensamentos os mais ousados e menos usados. Podiam, a principio, significarem tolices isoladamente, mas no texto cresciam. Vamos a alguns exemplos: “Sou mais a palavra ao ponto de entulho. / Amo arrastar algumas no caco de vidro / envergá-las pro chão, corrompê-las, / até que padeçam de mim e me sujem de branco”. Ou então: “Por viver muitos anos dentro do mato / moda ave / o menino pegou um olhar de pássaro: - contraiu visão fontana. / Por forma que ele enxergava / as coisas / por igual / como os pássaros enxergam”.
 Vejamos mais, não podemos perder a oportunidade: “Tentei descobrir na alma alguma coisa mais profunda do que não saber nada sobre as coisas profundas: Consegui não descobrir”.

Manoel de Barros era um homem que conhecia tanto sua aldeia que resolveu dar uns passeios pelo mundo e conheceu a Europa e os Estados Unidos. Daí que possui obras traduzidas na América do Norte, Espanha e França, ou seja, em inglês, francês e espanhol. E não obstante, ser portador de prêmios como o Prêmio Nacional de Literatura, do Ministério da Cultura, o Prêmio Jabuti, da União Brasileira de Escritores - SP, em dois anos (1990 e 2000), entre outros, nunca teve da crítica a divulgação merecida. Ninguém sabe que mistério preside a chamada “grande imprensa” para desconhecer os grandes valores intelectuais e poéticos do nosso país. Noutro qualquer país, até da América Latina, ele já teria ganho o Nobel. Mas como, se os jornais, as revistas, a tevê, os editores teimam em desconhecê-lo? Membro da Academia Brasileira de Letras, da qual recebeu prêmio por suas obras, em 2000. E os resenhistas de plantão não viram.

Têm-se, agora, vaga notícia de que a editora Leya lançou, em novembro do ano passado, sua obra completa, muito depois de o poeta completar 90 anos. Soa também, por aí, que uma outra editora - naturalmente deve ter comprado os direitos autorais da família - lançará sua obra completa em 2015.
A má distribuição de livros no Brasil, a má vontade das editoras com os bons escritores, tudo contribui, e muito, para a ignorância do brasileiro médio, aquele freqüenta escolas, inclusiva a universidade. Fazem com que sejamos uns pais de “ANALFABETIZADOS”: - como já apelidei aqueles que aprenderam o “B-A-BÁ”, mas não conseguem ir para frente, treinando os valores artísticos nas letras, das outras artes e das ciências. Nós não conseguimos “voar fora da asa”, como escreveu Manoel de Barros.

Para mim, a obra de Manoel de Barros supera a de todos os poetas até agora, incluindo Drummond. Não é por isto que não me reconheça influenciado por Drummond e filiado à sua forma de fazer poesia, embora muitas outras influências se tenham misturado em mim: de Castro Alves a Manuel Bandeira, todos bem aquinhoados com a divulgação e a editoração. Agora, eu pergunto, será que a literatura, no Brasil, está morrendo?  Manoel de Barros supera a todos e lembra bem o menino poeta Mário Quintana: os dois são meninos e são meninos porque fazem perguntas, porque misturam a linguagem para ficar mais bonita, vigorosa, inteligente.

“A mãe reparou o menino / gostava mais do vazio / do que do cheio. / Falava que os vazios são maiores/ e até infinitos. // Afundo um pouco o rio com meus sapatos /desperto um som de raízes com isso. // Eu precisava ficar pregado nas coisas vegetalmente e achar o que não / procurava”. (...) Sou um caçador de achadouros da infância. / Vou meio dementado e enxada às costas cavar no meu quintal / vestígios dos meninos que fomos”. Isto é um pouco da filosofia de Manoel de Barros, da poesia de Manoel de Barros que, aos desavisados soa como besteira, tolices, cousas mesmo de menino. Mas não, são cousas mesmo de poeta, poeta grande, de sua terra e do mundo, do chão e do ar, das trevas e da luz. E ele, para quem não haja lido, disse a maior verdade da história: - “Cristo foi um dos grandes poetas do mundo – tanto que já passaram 20 séculos por cima de suas palavras e elas são vivas e reviçadas todos os dias”.
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*Francisco Miguel de Moura, poeta brasileiro, nasceu em Jenipapeiro, do município de Picos - PI; já publicou perto de 40 livros, entre os quais metade de poesia Membro da Academia Piauiense de Letras, da União Brasileira de Escritores -  SP e da Associação Internacional de Escritores e Artistas - Toledo (USA).

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O QUE SÃO PRECONCEITOS E DISCRIMINAÇÃO?

FRANCISCO MIGUEL DE MOURA*
                        
      Todos nós sabemos o quesão  “preconceito” e o que é a discriminação. Esta é a parte melhor. A segunda é a pior: É que todos nós temos um, mais de um,    ou muitos preconceitos contra alguma cousa ou alguém. E esta última parte é a mais grave, porque, em nossa Constituição, está escrito no art. 3°, item IV, como sendo o um dos seus objetivos fundamentais: “promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação”.  

         Minha argumentação aponta o fato de que, se não houvesse preconceitos, em nossa sociedade (como nas demais), não haveria necessidade da lei.  Claro que ela existe, temos preconceitos porque somos humanos, dotados da faculdade de pensar. Pensar é bom, mas nem sempre pensar por pensar nos humaniza. Devemos pensar com o propósito de justiça e amor, virtudes que parecem contrárias, e não são. Uma leva à outra. Essas virtudes se aprendem em casa, vendo as ações retas de seus pais. O que se aprende na escola é muito menos do que isto, embora seja muito bom, desde que a escola seja excelente. Começa a aprender-se a viver em sociedade, em conjunto, uns suportando os outros, quebrando quinas do individualismo que todos os homens carregam consigo. Aqui me parece que uma pergunta está querendo espirrar: - E por que as crianças não têm preconceito? Poderia responder que é porque elas ainda vivem no mundo do sonho, das fantasias, não percebendo a realidade nua e crua das diferenças, sejam pequenas ou grandes. Para elas a terra é azul e plana, aberta como o horizonte e os céus.

          Mas vamos ao dicionário, o famoso “pai dos burros”, palavra que traduz uma infeliz discriminação contra aqueles que têm menos conhecimentos, menos capacidade intelectual. Busquemos a palavra “preconceito”, pois “discriminação” é, segundo pensamos, quando o preconceito já desceu à prática de alguma ação correspondente. O “Mini-Aurélio”, 7ª ed., muito usado nos colégios do curso fundamental e médio, diz: “1. Idéia preconcebida. 2. Suspeita, intolerância, aversão a outras raças, credos, religiões, etc.”.

         Como vimos, os preconceitos não se restringem apenas às pessoas de cor negra e aos pobres e miseráveis: estendem-se também aos amarelos: estendem-se também aos feios, aos defeituosos, aos velhos, e por aí vai. Por isto, sabiamente, nossa Constituição, depois de declarar os mais discriminados nominalmente (raças, cor, idade e sexo), acrescenta: “e quaisquer outras formas de discriminação”.
Como evitá-las? Somente através da lei? Seria um mundo de leis atos jurídicos para encharcarem mais o volume dos códigos que já possuímos. O Brasil, se não é o país que mais possui leis, seguramente é dos que mais as possui. As nações latino-americanas são pródigas em leis, sem prestaram atenção a que a lei sozinha não modifica a sociedade. É necessário lidar com a educação, só a educação educa (parece tolice dizer isto, mas, no caso brasileiro, não). Acreditar que um lei ou decreto obriga a pensar diferente é tão enganoso quanto pensar que se pode distribuir sem produzir. Quem produz educação é a escola, é a elevação do conhecimento e da sabedoria, a começar da educação doméstica.  E aqui se fazem leis até contra a palmadinha. Aqui uma sugestão, que pode parecer tola: Talvez fosse melhor que se fizesse uma lei que obrigasse os pais a freqüentarem escolas para os pais, assim como os motoristas do trânsito estudam essas leis e prestam conta delas. Embora muitos ainda as descumpram. Foi a educação doméstica que lhes faltou, a verdadeira, a essencial. Também não é pra menos, porque a moral social está destroçada na base – a família, a gênese. Ela embarcou numa tal de revolução sexual e noutras para as quais a “mídia” lhes empurra. Assim foi gerado um pandemônio de ligações e desligações entre pais, mães, filhos, etc. Pode parecer preconceito falar sobre isto e não favoravelmente tal como anda a carruagem. Não importa que se casem nesta, naquela ou naquela outra religião ou apenas no juiz, também não importa a nomenclatura. O que importa é o essencial – a promiscuidade - que começa muito cedo, nas escolas e universidades, praticada pelos moços e mocinhas e continuada na vida adulta. A promiscuidade é uma decadência, uma coisa tribal, primitiva. Aí não há preconceito de cor, nem de nada. Enquanto a natureza faz sua parte criando o HIV, a ciência tenta vacinas que nunca deu certo. De qualquer forma a pessoa foi destroçada. Que será da família?

         Votando ao tema inicial, vejo a separação entre brancos e negros que começa a processar-se por causa das leis restritivas ao acesso à universidade pelo critério do mérito. É como se quisessem tirar um atraso de 400 anos dentro de uma ou duas décadas, para chegar a uma igualdade ilusória – visto que todas as criaturas são desiguais. É querer frear a naturalidade da lei que se processa na miscigenação de brancos e pretos, sem nenhum problema, desde a era da escravidão até agora. Os brancos de hoje não têm culpa do que os passados fizeram. Edita-se, assim, a fábula de de La Fontaine, “O lobo e o cordeiro”. Todos já sabem, não vou repeti-la. Apenas encerro dizendo que os antigos não sabiam tudo, mas sabiam quase tudo. Sabiam, portanto, que a razão é sempre do mais forte, nas sociedades primitivas. Mas estamos lutando para que a nossa não volte à estaca zero.

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*Francisco Miguel de Moura – Escritor, Membro da Academia Piauiense de Letras, da UBE-São Paulo e da Associação Internacional de Escritores e Artistas - Toledo (USA).   

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

BRASIL, DESORDEM E REGRESSO: CORRUPÇÃO

*Francisco Miguel de Moura
                Escritor


        Nenhum ser humano viveu sem sentir solidão, sem procurar a solidão em algum momento de sua vida, seja num canto afastado de sua casa, num beco imundo de rua, numa cela, ou em liberdade como um cidadão. É a nossa irresistível individualidade que nos chama, pois ninguém é completo nem livre como queria o escritor Jean Paul Sartre, criador do existencialismo. Conforme teoria recente, do médico e psiquiatra Augusto Cury, também precisamos da conversa com os outros, do “burburinho da cidade”. Por isto o mundo hoje é essencialmente citadino, ao contrário do passado onde a solidão era mais degustada. Pensando mais um pouco, os que gozaram das maravilhas de ser “matuto”, viveram em contato com a natureza, acham ter vivido um “paraíso perdido”. Vivemos juntos e sós, participamos da sociedade para mostrar quem somos, é a necessidade urgente da nossa solidão, ouvindo a dos outros. Mas ninguém vive a solidão alheia, a doença, a dor, a fome e o desamparo.  É uma metáfora, ou metonímia o que dizem as teorias literárias de que os poetas sentem a dor do outro. O poeta Fernando Pessoa, no seu pensamento e palavreado, nos enfiou esta fantasia: “O poeta é um fingidor / finge tão completamente / que chega a fingir que é dor / a dor que deveras sente”.

       Mudando da poesia para a prosa, disse o escritor Augusto Cury, já mencionado: “Um profissional de saúde mental deve saber que jamais tocará ou sentirá minimamente a dor do pânico ou da depressão de um paciente”. Nosso pensamento é um comunicador virtual. E é neste sentido que sou incrédulo da comunicabilidade. Cada homem fala para si, vive para si e mais ninguém. O amor é a única coisa que aproxima as pessoas, mas, até o amor é interesseiro. Vivemos de troca. O comércio é troca. A esmola é troca. O favor é troca. O pensamento é troca para o encontro do social. Todos querem contar a sua história.  É por isto que todos somos sujeitos da história, fazendo a nossa própria história. Quem não tem história não é nada. Até os moradores de rua, quando não completamente alienados, contam a sua história, tem necessidade de contar quem foi na vida, o que fez, o que deixou de fazer, o que pretende...“Precisamos nos mostrar porque é assim que legitimamos nossa presença no mundo”, escreveu o cronista Gilmar Marcílio, que também é psiquiatra e psicólogo, em seu livro “O mundo é o que é”. Tudo o que fazemos é para nos mostrar, somos individualistas, egoístas, carentes, somos pobres e ricos, pretos e brancos, feios e bonitos. Mas, sobretudo, somos um complexo de corpo e alma. Somos cheios de problemas. E se alguém diz “eu não tenho problema” – na verdade, este é um grande problema. 

        Depois de falar no individualismo precisamos atravessar um rio desconhecido e chegar ao outro lado da questão: a sociabilidade. Por mais que nos mostremos solidários, caridosos, por mais que mostremos os “nossos bons propósitos”, aflora lá dentro o desejo de ser indivíduo. Ser bom individualmente é uma coisa, ser bom através do estado, do dinheiro dos outros, de uma instituição, é outra muito diferente. Qual o interesse maior que o move? Lembro de uma brincadeira de quando eu era menino. Andávamos normalmente em par, um fazendo companhia ao outro. No “jogo de castanha”, o mais sabido (não o mais sábio, sábio é santo, é exceção), depois de ter ganhado todas as castanhas, diz ao perdedor: “Olhe aqui, não fique triste não, nós vamos continuar o jogo, vou dividir o que ganhei entre nós dois”. E partiu para a divisão, assim: “Duas pra mim, duas pra você, duas pra mim”, e recomeçava: “duas pra mim, duas pra você, duas pra mim” até terminar. Era o mesmo que dizer: “Quem parte e reparte fica com a melhor parte”. Assim são os políticos, os líderes, os promotores ou donos das associações de caridade, etc. 
        A sociedade é exímia criadora de ilusões (as utopias): o estado, a democracia, o socialismo, o capitalismo, o comunismo. As mais cruéis são as tiranias, as ditaduras, quer de direita, quer de esquerda, quer socializantes, quer não socializantes. O próprio filósofo de “O capital” e criador do “Materialismo histórico”, base para a utopia do socialismo científico (comunismo), o filósofo Karl Marx, não acreditava em nenhum estado e dizia que, naquela época e naquele país (Rússia), era necessário o poder despótico (a ditadura), mas isto seria apenas por “um momento” salvador. Sua aspiração era a autogestão, e consistia em que cada pessoa gerisse a si mesmo e os bens que lhes fossem necessários. Não pensou que, assim, voltaríamos uma sociedade primitiva. Ele não acreditava nos discursos dos ditadores nem dos democratas. Achava que eles pregavam “boas intenções”, mas escreveu que “o caminho do inferno está todo pavimentado de boas intenções”.

      Após tantas revoluções, cruentas ou não, sobraram as utopias e aquele burburinho das cidades que nos fez cidadãos com deveres e direitos para com o estado e suas instituições. E ele, através da publicidade barata, comprada, corrompida, nos envolve, nos torna neuróticos, ocupa o nosso cérebro com ideologias interessadas em enterrar nosso “eu”, aquele sujeito que deve comandar nosso pensamento e promover nossa história verdadeiramente. Mas o ‘eu” foi substituído pelas mentiras dos chefes, pela falta de caráter deles, que ouvem o que lhes interessam, deixando o povo, cidadãos e cidadãs, à mercê de qualquer aventureiro e falso condutor. Só há um internacionalismo: É o do capital. E os países, como seus costumes, são castigados. Por isto há tantos Napoleão, Hitler, Mussolini, Getúlio, Chavez, Fidel, Morales entre outros vivos e mortos.

           Só Jesus Cristo nos salvará deles.

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*Francisco Miguel de Moura – Escritor e membro da Academia Piauiense de Letras,sócio da IWA - International  Writers and Artists International - Estados Unidos.

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