domingo, 11 de janeiro de 2009

CALENDÁRIO - 2008 - 2ª SÉRIE - EDSON GUEDES DE MORAIS*

Julho - 2008



BALANÇO DOS SESSENTA

Francisco Miguel de Moura*


Não quero mais pisar no meu passado,
não quero mais saber do meu por-vir.

Se estão fugindo as horas, se hei de ir,
meu ser precisa estar recompensado.

Que me salve o presente, o grão-vizir
do amor, no aconselhamento e agrado,
enquanto eu nado o mar de lado a lado,

enquanto não há lágrima a despir.

Preparo as asas de ícaro sem penas,
desmantelo engrenagens, solto antenas,

que as empresas do "não" se tornem "sim".

Como tantas das vidas, minha vida

foi sempre uma derrota comovida.

Vivi de sustos. Não viver assim!


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Agosto - 2008


INFIEL... O TEMPO

Francisco Miguel de Moura*

Cruéis e desumanos, com trapaça,
torcemos a dinâmica da vida,

quando outra, talvez grande, nos convida

a dar adeus ao que passou, que passa...

Ser mecânico e fiel a si, sem queixa,
é o tempo e no espaço tem guarida,
enquanto nós fazemos-lhe a ferida
que deságua na morte e em dor se fecha.

Sobre a ilusão do tempo e sua ótica,
quero crer temos vida mais caótica,
basta ouvir-se os reclamos da paixão.

Cruéis e infidos somos nós primeiro,
pois só o prazer queremos por inteiro

quanto mais bata o nosso coração.
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Setembro - 2008




DESENCONTRO

Francisco Miguel de Moura*


Tomado de saudade e sofrimento,

um dia eu quis rever a terra amada.

Sondei a posição vária do vento
e pus meus olhos e meus pés na estrada.


Noite ainda (acordei de madrugada),

tinha a lua por luz, por seguimento...

Nem sentia o cansaço da jornada,
pensando no ontem, no hoje como alento.


Me alegrava pisar velhos caminhos!
Os pássaros cantavam nos seus ninhos

e a natureza toda, então, sorria.


Ouvi tocar o sino em minha aldeia,
lembrei das orações na hora da ceia

e da casa que outrora me acolhia.

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Outubro -2008

CRIME DE AMOR

Francisco Miguel de Moura*


Vira do sol fulguração ardente
que se compare à dos teus grandes olhos?
Teu sorriso dá crença ao mais descrente
nauta perdido entre calhaus e escolhos.


Dormem longos cabelos nos teus ombros
e vem-me a brisa murmurar baixinho
que, em virtudes sagradas, meus escombros
serão mudados pelo teu carinho.

Porque há no solfejo dos teus lábrios
o que quero falar, se algo me oprime

busco-os: remédio para meus ressábios.

Banhan-se em pranto o teu e o meu rosto.
E porque o mundo diz que amor é crime,
odeio o mundo por te dar desgosto.
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Novembro - 2008

CONTEMPLANDO

Francisco Miguel de Moura*

Nada pensar! Meu pensamento é impuro,
nada filosofar... Que coisas tolas
são mestres, são alunos, são escolas.
Para ser claro, vou buscando o escuro.

Nem por belas vaidades me torturo:

Detesto mais a dor de um revolta,
não reclamo dos anos nem da volta
do que vem-me à memória. Nem procuro.

Já não me encontro aqui, tudo me foge,
qual se ontem fantasma fosse o hoje,
e apenas pra falar e consumir.

Um mal com outro mal que se acoberte,
que para mim, futuro, és já não ter-te...
Que palhaçada! Já não posso rir.
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Dezembro - 2008
QUERENÇAS

Francisco Miguel de Moura*


Quero ter a vaidade dos caminhos:
- Dão passagem mas pouco dão abrigo.
Quero ter o orgulho do tufão,
quero ter a tristeza do jazigo.

Quero sentir da tarde a lassidão
e a solidão da noite no deserto,
das pobrezinhas flores - o perfume,
como as nuvens - ficar no céu aberto.

Quero ter emoções de amor secreto,
sentir como se sente uma paixão,
pra cantar glórias e chorar amores.

Quero viver do ideal concreto,
quero arrancar de mim o coração,
incapaz de conter todas as dores.

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*Francisco Miguel de Moura, autor dos sonetos, poeta e prosador, mora em Teresina, Piauí; Edson Guedes de Morais,organizador do "Calendário - 2008" e selecionador dos poemas, escritor, contista e poeta, mora em Recife - Pernambuco

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