terça-feira, 5 de agosto de 2008

DA MOÇA « BEM » SENTADA (1, 2 e 3)

POEMA SOBRE POEMA


Cristino Cortes*

Ao meu colega brasileiro, por sinal homónimo
Quase do meu próprio pai que já lá está __ e a estas
Coisas jamais terá sonhado - eu lhe devo festas
E vénias pela ideia que roubo por sinónimo.

Não o disse, não teria de o dizer - mas eu sei
Que essa tal moça mal sentada usava saias;
E bem curtas, pouco mais, sim, que um tem-te e não caias
Abaixo do umbigo, se de frente eu a verei.

De supor o resto da indumentária seria
A condizer o permanente Verão do Brasil;
E eu ainda juntaria, errando um em mil
Que a dita moça menos dava que prometia…

Mas sou da Europa, velha e sabida, ao que ele
Diz mal digo eu bem - e o sorriso nos une a pele.

DA MOÇA « BEM » SENTADA (2)



Creio, aliás, que nem ele poeta nem eu, muito mais
Poderíamos avançar ou em frente prosseguir.
De comum encolheríamos os ombros, a sorrir
Assobiávamos como em antigas crónicas e anais…

Ainda bem que da moça assim sentada a vista
Ninguém no-la tira, nem ela no-la recusa.
Não é para velhadas como nós que ela a usa
E aquilo faz sem intenção… Não há quem lhe resista.

É próprio da idade, não está perdido o mundo.
Mais vale um suave sugerir, uma vaga promessa
Do que áspera frontalidade sem delicadeza…
Isso se não ensina, vem dos genes, vem do fundo.

Está pois sentada, se bem se mal não vou julgar.
Gosto de ver - disso não temos que nos desculpar.



DA MOÇA « BEM » SENTADA (3)



Deste velho país eu lhe direi, alguém que envia
Carta singela e clara: mensagem não se perdeu.
O tema é comum, e é bom sabê-lo. Um ar lhe deu
A essa moça que o poeta viu… Também eu a via.

Imagino-a numa esplanada perto duma praia
Mas não sentada em muro que delimitasse a areia.
O poeta que esclareça, mas na minha ideia
Não daria muito jeito, quase imaginando a saia

Traçar a perna, quem sabe se fumar um cigarro
Ou fazer o gesto __ para o pessoal impressionar
Armar aos cágados, dar-se ares de quem sabe ganhar…
Oh quem me dera esse tempo que não mais agarro!

Sente-se pois a moça - ou levante-se para se voltar
A sentar… A poesia nos há-de acompanhar.

­­­­­­­­­­­­­­­___________________
*Cristino Cortes, poeta português, mora em Lisboa, Portugal, onde tem publicado vários livros, o último de nome “Música de Viagem”, com uma dicção toda especial, que merece destaque entre os literatos lusitanos contemporâneos.

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