CHEIROS DE TERESINA (1852-2015)
Francisco Miguel de Moura*
O perfume desperta a mente para o
amor, para os amores. Seja de rosa, cravo, jasmim ou de manjericão, seja de
mato agreste, seja de planta plantada nos jardins e ruas da cidade. Mesmo
os piores cheiros nos levam a pensar em algo que conhecemos, em acontecimentos
que nos passaram, em músicas que foram ouvidas, em lugares que foram gravados
na memória.
Sinto os cheiros de minha cidade: mato verde na época
chuvosa e até na primavera quando os pau-d’arcos floram em roxo e amarelo. Não
há visão melhor do que essa, nem cheiro mais agradável do que o cheiro dos
ventos gerais de junho e julho, estendendo-se até agosto, especialmente quando
se sobe o Parnaíba de canoa ou o atravessa para Timon. Mas também quando
deitamos na varanda de nossas casas, diante dos quintais e jardins. Ainda
existem jardins e quintais verdes nesta Cidade Verde. É o milagre do amor de
seus filhos.
Como nos tempos das rodas da Praça Pedro II, com saudade
sinto o cheiro das meninas, moçoilas, das moças, enfim das mulheres passeando
no Teresina Shopping e no River Side, com os mais variados risos.
E me abebero da poesia do hoje, esqueço as tristezas e contrariedades do ontem,
e começo a sentir-me feliz por viver. Porque perfumes de mulher, seja namorada
ou amiga, conhecida ou desconhecida, se confundem com os de Teresina. Teresina foi
menina, hoje mulher. E como passaram os anos, sua feição como cidade transforma-se
em metrópole, com suas virtudes e seus defeitos. Restam ainda uns restos do
centro, da Frei Serafim e de uns poucos bairros como a Piçarra e a Vermelha.
Mesmo assim desfigurada, gosto de você, onde tenho
morada desde 1964. Mas, conhecia de antes. Do tempo do seu centenário, quando
cantei
São tantos os cheiros que trescalam e nos enchem as narinas
e os ouvidos que ficamos tontos. Assim,
podemos beijar e abraçar, os nossos e os que chegam. Aqui não há ninguém de
fora, todos os que ficam são nossos. Vejam o poeta Hardi Filho, que veio do
Ceará, hoje um dos piauienses mais legítimos; o cronista Deusdeth Nunes
(Garrincha), cearense que certo dia teve a tentação de voltar para Fortaleza:
arrependeu-se; logo estava de volta pra nossa santa Teresina. São os feitiços que somente as mulheres têm.
Toda mulher tem seus feitiços. Teresina tem seus mistérios, seus encantos. Quem
a conhece bem? Não posso dizer que a conheço, posso afirmar, sim, que me perdi
um dia no Parque Piauí e, para me localizar e encontrar o que estava procurando,
tive que me valer do celular e pedir a minha secretária o endereço e o telefone
da pessoa.
Teresina é grande demais para mim. É certo que aqui
faz calor, especialmente nos b-r-o =
bró. Mas, quando alguém se queixa do clima, costumo dizer:
– Vocês já imaginaram como seria Teresina menos
quente? Estaria cheia de paulistas e cariocas, amazonenses e goianos, mineiros
e gaúchos, trazendo outros cheiros.
Mas eu prefiro mil vezes os perfumes já conhecidos: não
terei o trabalho de ficar procurando que tipo e que flor. Vem de onde? Não vem,
é daqui mesmo.
***
*Francisco Miguel de Moura, poeta, cronista, contista, romancista crítico de literatura e artes, mora em Teresina, PI, de 1964. Está crônica é inédita, faz parte do seu livro inédito, de crônicas, denominado “Conversas Silenciosas”, e prefaciado pela escritora portuguesa Maria Helena Veutura.
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