Poeta e ficcionista
A morte do Prof. Santana, como era bastante conhecido, não nos
causou surpresa, visto que vinha convalescendo há muito tempo, em virtude de um
AVC que o levaria a anos de cama. Um como que alívio do seu sofrimento junto
aos familiares, acadêmicos e a uma legião de amigos, eis o que nos repassam
essas primeiras horas do infausto ocorrido. Ainda me encontro atrapalhado,
angustiado ao iniciar esta crônica. Não era o que queríamos. Gostaríamos,
sim, de vê-lo viver com saúde, alegria e disposição de luta – como o fez sempre
– pelas nobres causas: a educação, a ciência, a economia, a filosofia e a
cultura, com aquele vigor que só os fortes têm. Longe das canseiras da terra, terá o merecido
descanso junto aos eleitos de Deus. Conheci o Prof. Santana desde quando fez
uma palestra para os alunos da Faculdade Católica de Filosofia do Piauí (FAFI),
ali na Praça Saraiva. Era uma época de grande sofrimento no Brasil, anos da
Ditadura Militar de 1964. Mas sua fala dirigia-se à ciência econômica e à
cultura. Num determinado momento, eu quis pedir-lhe aparte para retrucar alguma
coisa que me parecia ilógica, mas fui desestimulado pelo colega Antônio José
Medeiros. E ele fez bem. O Prof. Santana era inquestionável, não que não fosse
democrata, mas conduzia verdades com clareza que era impossível não aceitar.
Saber, segurança, palavra fácil, conhecimento profundo do que pregava – não
havia ser contestado, mas apenas arguido – pois seu tom era o do saber, dos
saberes: filosofia, economia, sociologia, história, tudo tecido numa voz que
impressionava. Depois, passados alguns anos, a ditadura havia ido embora, ele
já acadêmico da APL e eu ainda não. Encontramo-nos numa livraria. Conversa
amena e agradável. Era uma pessoa cheia de vida. Quando me tornei acadêmico, lá
também soube da sua fama, e a esta altura já o havia lido sua primeira obra, que
versava sobre a Economia Piauiense. Passaram-se mais uns anos e ele foi eleito Presidente
da Academia. E eu fui convidado a secretariá-lo. Fez o que pôde, dentro das
funções e possibilidades, contando com o apoio dos demais confrades. Nas
batalhas para angariar financiamentos dos projetos, eu o acompanhava, com
prazer. Foram muitas publicações, entre as quais uma série de revista (chegando
aos 10 números) que contemplavam a vida e a obra dos maiores escritores e
homens de cultura do Piauí, até então sem a devida divulgação. A “Revista da
Academia” estava em atraso: Dois números tiveram sua edição, além de livros e
conferências na passagem do milênio 2000-2001. Terminado o seu mandato,
convidou-me a para ser seu substituo. Caso estivesse disposto a concorrer,
teria o seu apoio. Mas eu declinei do pedido, uma vez que iria concorrer com o
eminente Des. Paulo Freitas. Membro do
Conselho Estadual de Cultura, no cargo de Vice-Presidente, assumia a
Presidência, e nessa mínima ocasião assumiu a batalha pela recuperação do
prédio da Biblioteca Estadual. Realizou “in
loco” mais de uma sessão com o
Diretor, professores e alunos. Finalmente conseguiu, a muito custo, que o
Governo do Estado cuidasse do que devia ser cuidado imediatamente.
Leitor, encaminhei esta matéria mais para o lado
pessoal de minha convivência com ele. Eu e o poeta Hardi Filho, visitávamos em
sua casa, amigos íntimos que éramos. Convivência agradável, inclusive de nossas
esposas com Dª Magnólia, seu amor de toda a vida. Aliás, com a morte de Dª
Magnólia, ele sofreu bastante. Na minha visão, desde o passamento de sua
companheira ele nunca mais foi o mesmo. Sua alegria, que era permanente, fugiu,
e sempre que tomava a palavra, pronunciava seu nome com a reverência de sentimentos
que outrora não expressava, por parecer ser uma personalidade inclinada mais
para o racional que para os sentimentos. Mas sempre demonstrou admirar os
poetas. Era um nobre no sentir quanto no pensar. Outros,
que escreveram sobre o Prof. Santana, já apontaram os cargos que ocupou e as
medalhas recebidas, que foram muitos, por merecimento. Diante disto, permito-me
copiar parte do que escrevi sobre ele, no livro “Literatura do Piauí” (2013), colocando-o no pórtico do capítulo
entre a geração Meridiano e a do CLIP: Raimundo Nonato Monteiro de Santana nasceu em
Campo Maior (PI), em 1926. Formado em Direito e Economia, professor emérito,
autor de “Introdução à Problemática da
Economia Piauiense” (1957), “O Desenvolvimento Econômico Nacional na
Teoria Econômica Geral” (1959) e “Evolução
Histórica da Economia Piauiense” (1964) – uma brilhante inteligência e
grande vontade de contribuir. Deu sua parcela na evolução do panorama cultural
das décadas de 1950/1960. E continuou publicando obras suas e dos outros,
organizadas por ele: “A Nova Realidade-Mundo” (1997-1998), resultantes de cursos
e conferências na Universidade Federal do Piauí, na Universidade de Brasília,
na Escola Superior de Guerra e no Colégio Interamericano de Defesa
(Washington-EUA). Mais ainda: Continuou laborando nesse terreno, reuniu
inteligências e especialidades e propiciou edições coletivas, sob sua direção,
entre as quais “Piauí: Formação, Desenvolvimento,
Perspectivas” (1995) e “Apontamentos
para a História Cultural do Piauí” (2003). Portanto, o Professor Santana
não morreu: baixou à terra no dia 15-06-2018, mas subiu ao céu dos homens de bem
e da nossa memória.
________________*Francisco Miguel de Moura, membro da Academia Piauiense de Letras e da Academia de Letras da Região de Picos. Mora em Teresina (PI).
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