quinta-feira, 8 de maio de 2008

A BUROCRACIA E O “JEITINHO BRASILEIRO”


Francisco Miguel de Moura*

Houve um tempo em que o Presidente da República criou o Ministério da Desburocratização, nomeou e manteve o respectivo ministro e muitos papéis e normas burocráticas foram apagadas da vida do brasileiro. Durou pouco, mas foi muito produtivo, social, econômica e ecologicamente.
Ninguém sentiu falta da papelada desnecessária, a vida ficou mais fácil e nem por isto aumentaram os desvios funcionais e os escândalos como recentemente. Não são montanhas de papel, carimbo, selo (ele, o coitado, já voltou) que vão evitar os grandes desvios de verbas públicas, ou o desaparecimento delas – que todos nós adivinhamos seu destino. E enquanto medidas outras são “estudadas” pela classe burocrática para evitar o mal, maior distância ela vai acrescentando entre o público e o privado. Esta é uma das pequeninas grandes questões nacionais, por exemplo. Por que se tem que esperar dias e até meses, senão anos, para que um funcionário aponha um carimbo num documento? Para que se exigem tantas cópias juntas a um requerimento? Uma xerox vale mais que a caligrafia do proprietário do seu CPF ou do número de sua identidade aposta no documento? Só por que inventaram a máquina copiadora? E para que serve o computador com enorme capacidade de armazenamento, diminuindo o uso do papel e, portanto, colaborando na preservação da flora e da conservação da vida no planeta?
– “Ah, mas existem os vírus que corrompem os programas e aí tudo vai pro beleléu.”
– Mas existem também os antivírus e os cds com capacidade impressionante de armazenar dados, estatísticas, etc., contraponho.
Na minha vida de aposentado, salvo as filas desobedecidas, nunca encontrei chatice maior do que ter que levar, por exemplo, 5 cópias da planta de um terreninho para a Prefeitura, simplesmente porque a gente, o próprio dono, está querendo que a área do terreno do imóvel seja retificada – e no meu caso retificar para maior a importância a pagar em impostos. Sabemos que o papel que se gasta numa cópia de planta é enorme, porque elas são descomunais. Poderiam ser menores. Não sei, que falem os arquitetos e engenheiros.
Se burocracia tem que existir, que seja a mínima. Nenhuma burocrata evitou furtos, adulterações, crimes, nada. O que faz o homem ser melhor em sociedade? Obedecer às regras da lei sem tanta fiscalização através de duas coisas simples: educação doméstica e educação escolar, ou seja, família bem estruturada moral e financeiramente, e escola (uma boa escola). Aliás, na Inglaterra, a Constituição e outras leis não são escritas, estão na tradição, nos costumes, na ética social e pessoal. A burocracia, porque nas condições atuais da sociedade tem que existir, é um mal desnecessário. Nós a suportamos como um peso muito pesado; atrasa o desenvolvimento, o progresso, o trabalho, carcome as finanças do pobre brasileiro que, em média, ganha muito pouco.
A burocracia trabalha a favor do amolecimento da ética, da moral do cidadão, deixando tudo para as exigências legais, “decretais” e “portarinheiras” da administração publica.
A ética social só pode revitalizar-se em contato com a liberdade, o livre arbítrio, a livre satisfação de ser honesto. Mas o Brasil está longe disto. Os burocratas se colocam viseiras para só enxergar em linha reta, para não serem diminuídos em seu poder. A criatura, o cidadão, o homem privado desaparece em favor do papel, do selo, do desenho, do carimbo, da xerox e outros entraves dos mais inimagináveis gêneros.
Ao lado dela, a burocracia, floresce o “jeitinho brasileiro”, que não deixa de ser um descaminho necessário para que aquela não se torne tão massacrante para o cidadão.
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*Francisco Miguel de Moura, escritor brasileiro, membro da Academia Piauiense de Letras, mora em Teresina, Piauí.

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