terça-feira, 13 de novembro de 2018

ALGUNS POEMAS DE ELMAR CARVALHO (II)


Elmar Carvalho*


MULHER NA LAGOA DO PORTINHO

Na tarde antiga
de sol e bruma
de luz e penumbra
as dunas mudaram
de cores e formas.

Os belos olhos esplendentes –
pálidas cálidas opalas ou
esmeradas esmeriladas esmeraldas –
da mulher bonita
de sinuosas dunas e viagens
furta-cores furtaram
outros tons e sobretons.

Ainda guardo a memória viva
daquela tarde morna e morta
e ainda vejo aqueles olhos vivos
furtando furtivos cores e atenção.


E os olhos e as formas curvilíneas
permanecem intactos no tempo
que em mim não passou.

E a mulher, acaso passou,
nos escombros das formas
transitórias da beleza?...


ENCONTRO

Em teus olhos mergulhei
para rever
          reviver o já vivido.
Neles me embebi
                embevecido
ao arrebatar do inesquecido
“o que não foi
e que poderia ter sido”.
Colhi nas minhas
o perfume de tuas narinas.
A essência de tuas crinas e resinas
às minhas misturei.
Com os meus, colhi-te
os lábios, entreabertos
em suave espera e ânsia.
Beijei-te os olhos
– fechados para que visses e sentisses
plenamente a magia do momento –
e deles vertias o céu e o mel. 

AUTOBIOGRAFIA ZODIACAL

Sou do signo de
        Carneiro
mas meu coração é um
Touro indomável.
No meu sangue
corre a fúria de
         Leão.
Entre uma Virgem e duas
          Gêmeas meu coração/bala
          Balança.
Sou um Câncer
nos chifres de
            Capricórnio.
Sou Peixes libertário
sem o cárcere de um
            Aquário.
Sou Sagitário
        a
           r
             m
                 a
                  arco e flecha
                  d
                o
              d
            e
(A flecha é uma cauda de Escorpião.) 


PERDIÇÃO 

Por mares de sargaços e enganos
perdi-me na rota
de estranhos portulanos
feitos por arcanos d’antanho.
Por causa de lábios
que falavam de amor
seguindo incertos astrolábios
soçobrei nas tormentas
de algum cabo Bojador.
Egresso de Sagres
dancei a Dança dos Sabres
no mapa de meu destino.
Nas garras da ventania
joguei um jogo de morte
em que tudo se perdia.
No derradeiro naufrágio
encontrei enigmas e presságios
nos búzios que no abismo havia.
E tudo se findou
num veleiro encalhado
em mar de absoluta calmaria. 





PAISAGEM MARINHA 

        Fecho os olhos
e encosto a concha do búzio
        na concha de minha orelha
e escuto o ritmo frenético
         do mar
ou lhe ouço o rouco ronco rolado
         de ondas paradas.
Fecho os olhos e escuto
         a voz do búzio
e de dentro de sua concha
de cornucópia surgem
ondas, espumas e areias
peixes, corais e caracóis
alados cavalos-marinhos
e estrelas-do-mar e do ar
em galáxias de a(r)mar.
        (Meu coração
marinho sonha com sereias,
ilhas, coqueiros e veleiros.)
         De dentro
da concha do búzio
         sai um vento
recendente de maresia
         que me
leva/lava/lavra
como se eu fora um
         fruto do mar. 

ELEGIA DO AMOR FINAL 

Teus braços
que poderiam
tudo me dar
num simples abraço
se fecharam para sempre
para mim.
E teus seios perfumados
teus lindos seios sedosos
não mais me abrigarão
e neles não mais porei
minha boca sequiosa.
E teus olhos que
poderiam devassar e possuir
meu ser interior
mesmo que me fitassem
não mais me veriam porque
para mim para sempre
se fecharam com suas longas
pálpebras de sonho e de medo.
E tuas belas mãos
tuas delicadas mãos para mim
se fecharam e me esmurraram.
E teus lábios
teus lindos lábios
emudeceram e se fecharam
num longo beijo sempre negado.
E teu sexo me foi sempre uma
concha eternamente fechada.
E teus cabelos
à brisa eram lenço
acenando em despedida.  

SEX-APPEAL 

Movo até o teu
meu amoroso coração
 - ânfora de lágrimas e solidão.

Teu olhar me revida
com uma impressentida carícia
referta de promessas e delícia.

Teus olhos escorregam macios
das penumbras dos cílios armados em cios
e afagam minha pele
eriçada em arrepios.
Meus anseios
desvelam tuas vestes
e revelam os empinados penedos
sedosos de teus seios,
sem medos
e sem receios,
e devassam em
tênues e tímidos acessos
os teus mais secretos
úmidos e diletos recessos.

E eu te desejo mais que tudo
mas me contenho e me abstenho
e me deixo ficar inerte e mudo...
______________________________
* José Elmar de Melo Carvalho, poeta piauiense e membro da Academia Piauiense de Letras.  N. B, - Esta segunda série é o complemento da primeira, publicado no blog Revista Cirandinha, de Francisco Miguel de Moura, ambas com autorização do Autor.

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