sexta-feira, 1 de abril de 2011

A SOCIEDADE PERFEITA

Nascimento de Vênus, de Sandro Boticelli
Francisco Miguel de Moura 
Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras

Muitos filósofos e líderes já pensaram e proclamaram a necessidade de uma sociedade perfeita. Quantos livros, revistas, jornais, discursos e teorias não se fizeram! Quantos regimes políticos e econômicos! Como se poderia construir um edifício de desiguais que saísse perfeito? Vamos enumerar alguns exemplos dessas construções intelectuais: O “Paraíso Perdido”, onde, segundo Moisés, Deus colocou nossos primeiros pais, Adão e Eva, para que fossem felizes; a “Sociedade Perfeita”, governada por filósofos, da crença de Platão; a “Utopia”, de Thomas Moore; a “Idade de Ouro”, de que fala Vergílio, em seu poema “Eneida”.  Essas e outras são entendidas hoje como utopias. 

Na modernidade, “as distopias”, neologismo cunhado por Gregg Webber e John Stuart Mill num discurso ao Parlamento Britânico, em 1868, entendidas filologicamente como "utopias negativas", são as criações mais em voga, na literatura e no cinema. E foram propostas e propagadas nos seguintes livros e filmes: “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley; “1984”, de Georg Orwell e “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury, entre tantas outras, comparecendo cada uma com seus ingredientes destrutivos. A mais antiga e espontânea delas é o “Apocalipse”, talvez em virtude do peso das religiões cristãs, na civilização. Tanto nas utopias quanto nas distopias, as verdades que afloram são as mesmas: – O homem é bom e a sociedade não presta e vice-versa. O mesmo conflito entre o indivíduo e a pessoa. Pessoa significando o reconhecimento de que é da natureza humana associar-se para ter a sonhada felicidade; indivíduo, como a redução do ser humano ao estado natural, com sua vontade  soberana. 

Então, do ponto de vista social, ao encarar o controle do estado, se cada indivíduo, como a própria palavra diz, é singular, diferente, chegaríamos a um impasse: – Nossas formas de governo reduzir-se-iam a duas: anarquismo e tirania, e os nossos sistemas econômicos, a dois: capitalismo e socialismo.  

Mas não é bem assim. Com os gregos, o mundo encontrou a forma democrática de governo que, se não é perfeita, é aquela que chega mais perto disto, tendo em vista que no seu seio há mecanismos para regular o indivíduo e a sociedade. E há também, depois, a utopia do comunismo, não referida acima, a variação da social-democracia, onde o capital é o agente da produção e do mercado, enquanto o trabalhador executa seu trabalho dentro de um contrato que se renova ou se desfaz, para retornar apenas depois da necessária negociação. Tudo passa a ser negócio, inclusive o trabalho. Há uma comunicação contínua entre os dois agentes: capital e trabalho. Eles se encontram no mercado. Ora, alguém já disse que “se duas pessoas se encontram e trocam entre si um pão, cada uma continuará apenas com um pão; mas, se trocarem idéias, cada pessoa sairá com duas idéias”. 

É, pois, na possibilidade dessa comunicação e troca de idéias que começa a democracia: direitos e deveres, cidadania, respeito e educação. O homem deixa de ser animal natural e passa ao estado de humanidade. O que distingue a natureza humana não é a cor da pele, a altura, a força, a fraqueza, a feiúra ou a beleza. O que começou a distinguir o ser humano dos demais foram duas características básicas, ímpares: a piedade (sentimento vago que o leva a ajudar seu semelhante), por um lado, e por outro, a perfectibilidade (faculdade que permite desenvolver todas as outras, a capacidade de tornar-se civilizado). Mesmo ainda no estado de natureza, o homem normal era (e é) uma criatura bondosa e possível de educar-se, sem deixar de ser dessemelhante nos demais aspectos ou características. E se a uma sociedade perfeita não chegamos, jamais o mundo há de perdê-la de vista: – É no que a maioria dos homens acredita, no fundo de si mesmos.

Visite também estes blogues:
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5 comentários:

Gisa disse...

Sociedade perfeita é uma imagem distante mas que deve sempre servir como parâmetro de meta.
Um grande bj querido amigo

Iram Matias disse...

Sociedade perfeita so nos nossos sonhos.
Mais um texto rico, meu querido.

Bom, excelente fim de semana pra vc.

Beijos

carmen silvia presotto disse...

"O que distingue a natureza humana não é a cor da pele, a altura, a força, a fraqueza, a feiúra ou a beleza...."

Concordo, o que destingue a natureza humana é o amor de construção,isto é, a empatia de se colocar no calcanhar, na sombra, na dor, na alegria do outro... para aprender a contextualizar.

Um abraço e bom estar aqui te lendo.

Carmen.

CHIICO MIGUEL disse...

Parabéns a todos que leram o meu texto, especialmente os que comentaram,
pois ele é preparado com todo carinho e muito estudo. Feito para valer a pena. Se valeu, estou recompensado.
Obrigado.
francisco miguel de moura

Anônimo disse...

Texto muito bom.
Parabéns! Abraços

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