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terça-feira, 14 de março de 2023

 


POEMAS SINTÉTICOS

             Francisco Miguel de Moura*

           1

um rosto sem gestos

torturando a alma

sem gosto nem fala 

onde o poeta expõe

 seu ser e seu trauma.

            2

versos de amor

terso de sim

ao mundo fundo

dos outros nãos

   de mim.

            3

greve nos céus

os anjos da guarda

aqui na terra

em escarcéus.

           4

a casca e o miolo

desamparados

havia flores

de ingenuidades

restaram espinhos

devoradores.

        

 

           5

amar, água corrente

gemendo na descida,

só querendo subir:

a quanto amor obriga!

            6

amor,

humor

colore a vida.

            7

violência

contra violência

não compensa

nem com pinça.

          8

meu ipê a/gosto

floresce e decora

aterra a tristeza

espera setembro.

           9

não sou o que vejo

nem o que me vês

na praça, no espelho:

somos noves-fora.

         10

chinela de mãe

dança na bunda

 do seu neném 

molhado em xixi

em choro afunda.

         11

morrer sonhando

entre verso e brinco,

varando o ar:

poeta ou menino?

         12

atrapalhando

atrás pulando

atravessando

perdeu o gol

saiu do time

descamisado.

        13

abrindo as pernas,

a mulher salta

da noite pro dia

e acorda o homem:

saco vazio.

        14

quem fui 

não sou

só sinto

não soo.

     15

seja você

não olhe o outro

deixe seu rastro

de vivo ou morto.

         16

juiz não julga

diante da lei

por bem ou mal:

onde seu ser?

        17

entre o grande

e o menor poeta

melhor calar.

leitor, aquieta.

        18

desfiz o que não fiz

faço o que sou

para encontrar-me

no que sempre quis.

         19

o grande poeta

tem um editor

o pequeno poeta

faz de conta

e o poeta bissexto

joga tudo no cesto

e não enche.

          20

havia flores em mim

tão ingênuo que eu era!

levaram-nas consigo

ficaram os espinhos...

e a fera.

          21

 eu falo

você fala

quem ouve

trescala.

          22

quem criou o homem

foi um deus perfeito,

e deu-lhe liberdade:

a imperfeição.

          23

quem criou Adão

colocou no Éden,

disse ser eterno

o homem,

o jardim, não.

        24

O impossível

não tem face

em jeito:

Está completo.

      25

Cada grão de areia:

versos meus de vida

amor e paz

alguém duvida?

       26

Areia branca

que pisei sem graça.

Ninguém dirá

se a cor é raça.

        27

Antes da aurora,

à queda fria da flor,

abelhas fogem.

       28

Uns olhos felinos

feriram meu coração

terroso de menino.

____________

 *Francisco Miguel de Moura, poeta brasileiro.

 

 

 

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