POEMAS SINTÉTICOS
Francisco Miguel de Moura*
1
um rosto sem gestos
torturando a alma
sem gosto nem fala
onde o poeta expõe
seu
ser e seu trauma.
2
versos de amor
terso de sim
ao mundo fundo
dos outros nãos
de mim.
3
greve nos céus
os anjos da guarda
aqui na terra
em escarcéus.
4
a casca e o miolo
desamparados
havia flores
de ingenuidades
restaram espinhos
devoradores.
5
amar, água corrente
gemendo na descida,
só querendo subir:
a quanto amor obriga!
6
amor,
humor
colore a vida.
7
violência
contra violência
não compensa
nem com pinça.
8
meu ipê a/gosto
floresce e decora
aterra a tristeza
espera setembro.
9
não sou o que vejo
nem o que me vês
na praça, no espelho:
somos noves-fora.
10
chinela de mãe
dança na bunda
do seu
neném
molhado em xixi
em choro afunda.
11
morrer sonhando
entre verso e brinco,
varando o ar:
poeta ou menino?
12
atrapalhando
atrás pulando
atravessando
perdeu o gol
saiu do time
descamisado.
13
abrindo as pernas,
a mulher salta
da noite pro dia
e acorda o homem:
saco vazio.
14
quem fui
não sou
só sinto
não soo.
15
seja você
não olhe o outro
deixe seu rastro
de vivo ou morto.
16
juiz não julga
diante da lei
por bem ou mal:
onde seu ser?
17
entre o grande
e o menor poeta
melhor calar.
leitor, aquieta.
18
desfiz o que não fiz
faço o que sou
para encontrar-me
no que sempre quis.
19
o grande poeta
tem um editor
o pequeno poeta
faz de conta
e o poeta bissexto
joga tudo no cesto
e não enche.
20
havia flores em mim
tão ingênuo que eu era!
levaram-nas consigo
ficaram os espinhos...
e a fera.
21
eu
falo
você fala
quem ouve
trescala.
22
quem criou o homem
foi um deus perfeito,
e deu-lhe liberdade:
a imperfeição.
23
quem criou Adão
colocou no Éden,
disse ser eterno
o homem,
o jardim, não.
24
O impossível
não tem face
em jeito:
Está completo.
25
Cada grão de areia:
versos meus de vida
amor e paz
alguém duvida?
26
Areia branca
que pisei sem graça.
Ninguém dirá
se a cor é raça.
27
Antes da aurora,
à queda fria da flor,
abelhas fogem.
28
Uns olhos felinos
feriram meu coração
terroso de menino.
____________
*Francisco
Miguel de Moura, poeta brasileiro.
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