Escritor, membro da Academia Piauiense de Leras.
Depois do “smartfone” ou simplesmente do celular, ninguém conversa mais com ninguém.
Já vai o tempo em que as conversas de calçada, à noitinha, quer em casas de vizinhos, de parentes ou não, as pessoas davam continuidade ao jornal da vida, aos mexericos, aos disse-que-disse. Além de serem uma espécie de jornal do povoado ou da cidade, serviam como divertimento das mulheres, coitadas, que passavam o dia no fogão.
Sim, é verdade que essas conversas de calçadas não tinham dono nem assinatura. Que interessante! No dia seguinte, o dito era desmentido e o conversador nem sempre era desmascarado. Ficava “no quem disse foi fulano”. O vento levava. Era divertimento, uma necessidade para todos: mulheres, homens e crianças.
Os meios de comunicação acabaram com a fala das pessoas. Não sei como ficará a voz humana no final deste século.
Acabaram-se também as cartas feitas à mão – quando as mãos trabalhavam, o cérebro se esforçando e fazendo o movimento junto com os olhos – fosse curta, fosse longa, chegava pelo Correio. E sempre emoções por cima de emoções: de quem era a carta? Olhava-se o nome do remetente. O que diria essa carta? As mãos continuavam trabalhando, abrindo o envelope, e o cérebro e o coração se aceleravam. Demorava um pouco mais do que os “emeiles” de hoje, do que as mensagens “esmartifônicas” de hoje, mas era surpresa por cima de surpresa, além da visão de uma boa letra que a gente elogiava, e da letra garranchuda que a gente lia por desempenho do ofício ou da curiosidade. Mas, de acordo com o agrado, tudo ficava num arquivo de família, e depois se tornariam provas históricas, documentos valiosos para pesquisadores nos museus.
Em se tratando de cartas, refiro-me especialmente a duas: uma da Profª. Teresinka Pereira (USA), que, ultimamente, está muito amarga e revoltada com o mundo e, agora, até com Deus. Sua carta sem datada, recebida em 05/09/2016, começa com esta frase: ”Deus fez um erro quando criou o homem primeiro”. Erro é seu pensamento, Teresinka, porque Deus não erra, segundo minha religião (católica) e muitas outras. Quem erra é o homem, somos nós, mulher e homem. Somos todos da mesma cepa, portanto não interessa saber quem foi feito primeiro. Somos todos iguais, em carne, alma e espírito. As diferenças são marcadas pela personalidade de cada um dentro da sociedade, esta sim, por nós criada. E sendo assim, quem erra é o homem (homens e mulheres), nós somos o verdadeiro caos da vida no planeta. Do restante da carta de Teresinka, talvez valha a pena citar um trecho que ela transcreve do seu guru, Frei Beto:
“A idade adulta da democracia tem nome: socialismo. Mas de tal maneira o inimigo esconjura tal nome, que temos medo de pronunciá-lo. Ainda não nos recuperamos da queda do “Muro de Berlim”. Coramos de vergonha frente ao capitalismo de Estado adotado pela China e o hermetismo idólatra da Coreia do Norte”.
Diante desse pensamento, ainda eivado de marxismo, estou achando que, com mais velhice, Frei Beto, um dia, vai chegar à razão, reconhecendo que o único regime, que existe desde os gregos (e eles sabiam mais do que nós), criado pelo homem é a democracia. Temos que aperfeiçoá-la, sem excessos de socialismo, mas com o retempero do homem no rumo de Deus da verdade, em pensamento, palavra e ações. Portanto: ditadura, nunca mais; comunismo, nunca mais. Quanto ao socialismo, quem lê a Bíblia há de ver como eram nossas primeiras comunidades cristãs: antes que socialistas, eram irmãs.
Eu gostaria de deter-me ainda, em outra carta. É escrita pelo meu amigo Roosevelt Silveira. Uma carta que veio por “emeile” enviado e recebido em 22-7-2016. Ele mora em Guaçuí - ES, uma linda cidade do interior do Brasil, onde montou uma biblioteca exclusiva para meus livros, ao lado de outra com obras de outros autores. Roosevelt é um discreto escritor, pouco se divulga e pouco é divulgado. Mas gosta de divulgar os outros. Meu colega (aposentado) do Banco do Brasil, pessoa de fino trato, amigo dos amigos, amigo dos livros (sobretudo dos meus), mas recebe cartas e obras de escritores famosos do Brasil inteiro. Eu não posso deixar de citar, nesta conversa silenciosa, uma parte dela que muito me sensibilizou:
“Quanto a seus contos, cheguei a lhe perguntar por que foram classificados como inovadores. Pela resposta, na época, vi que você não teve essa intenção. Como você me disse que sua característica seria, em virtude dessa classificação, melhor como contista do que como romancista, aqui vai a minha fraca opinião, mas sincera opinião, pois não sou crítico nem experto no assunto. Embora pareça que você se sente mais poeta que prosador, para mim sua grande força é como romancista. Você é um poeta em essência, mas eu o vejo como uma espécie de filósofo quando verseja; em vista disso, seus poemas talvez não sejam todos acessíveis ao povão, ao simples leitor. Os seus contos também costumam não ser tão fáceis de serem interpretados. Já no romance você se faz entender por todo o mundo. Seu “Dom Xicote”, um grande romance, é exemplo do que digo. “Laços de Poder”, que li há muito tempo e não me recordo muito do enredo, também me impressionou, principalmente pelo final.”.
Elas, as cartas, estão quase se acabando. Que pena! Elas podem dedicar-se aos recados, ao amor, à amizade, ao coleguismo, à crítica impressionista. Pecados da carta: a descortesias, os desentendimentos, pois ela deve ser sempre polida, atenciosa, cordial e decente.
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